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Carlos Boneca

Era normal.

Todo dia pela manhã bem cedo se levantava e comprava seu jornal. Dava bom dia ao jornaleiro, ria de alguma piada sobre futebol. Seguia sua rotina voltando para casa passando pela padaria. Como no jornaleiro, dava bom dia a todos os funcionários, comprava seus pães, presunto e queijo (sempre prato, nunca muçarela).

Por volta das nove horas da manhã pegava sua bicicleta e descia pela Teodoro Sampaio até a Brigadeiro Faria Lima em direção ao trabalho, uma das muitas agências de publicidade de São Paulo. Era redator, ao menos era isso que os vizinhos sabiam. Trabalhava até as dezoito horas, quando voltava para casa.

Por sinal, morava em uma pequena vila, daquelas que ainda sobrevivem a especulação imobiáliaria e habitada em sua maioria por imigrantes italianos ou seus descendentes. Gente idosa em sua maioria. Carlos não era nem uma coisa nem outra.

A noite as luzes da casa se acendiam. Mas sem nenhum som. Apenas o brilho inconstante da televisão. Uma vez escutaram o som aumentar e diminuir repentinamente, em seguida Carlos saiu de casa e voltou horas depois com um novo fone de ouvido sem fio como viram os vizinhos.

Tudo era normal.


A Fã


Ana Clara adorava livros de vampiro. Desde os quinze anos, quando assistira pela primeira vez nos cinemas a segunda parte de Crepúsculo ela tinha certeza que nascera para ser uma nova Bella Swan.

Tinha todos os livros lançados em português, com e sem as capas do filme, canetas, cadernos, capas para celular, enfim, se algo tinha a foto de Bella ou do vampiro Edward ela implorava a seus pais para comprarem.
- Mas e daquele lobisomem, o Jacó? – Perguntava a mãe na papelaria, uma pergunta que sempre fazia.
- Jacob, mãe.
- Isso, isso... Caderno dele não pode?
- Jacob não é vampiro, é lobisomem e fedem como cachorro.

Cuma?

- Vamos, você consegue. Os olhos reviraram e procuraram uma saída. Não havia. Atrás dele cinco pessoas fortes, daquelas que o bíceps de um deles era seu torax. Do outro um pequeno muro, uma plaquinha simpática com a foto de um cachorro nadando em uma piscina de sangue.

 

Apenas um cafézinho.

Olhou para o copo de café sobre a mesa.

Não conseguia tocá-lo. Seu corpo implorava por aquelas gotas de energia e em algum lugar tenebroso em sua mente o café parecia transmutar-se em uma lata de espinafre e a voz de Olívia Palito ecoava em sua mente pedindo socorro.

Não queria tomar o café. Não era certo em sua mente que toda sua produtividade naquele dia oneroso de trabalho estive ligada intimamente àquele coquetel de cafeína proveniente da sempre amiga cafeteira automática. Aliás, olhava para a máquina de café colocada estrategicamente a dez passos de sua mesa e se indagava quando ela chegara.
 

Procuro mas não acho, ou acho que procuro.

Primeiro procurei na meia. Não estava lá, eu procurei, fucei, sacudi mas não te encontrei. Eu tinha certeza que estava ao lado daquela nota de cem reais que reservo na meia direita e que por ventura coloco na esquerda. Nem em uma nem em outra. Mas como todo bom brasileiro, se não sou insistente sou também teimoso como uma mula, logo, continuo a te procurar. Minha esposa dorme profundamente, mas mula não tem sentimentos, e a cutuco.

Ocaso do interior. (Tonho)


Um banco, uma praça e duas senhoras, ambas tricotando casacos.

- Sabe o Tonho?
- Que Tonho?
- O Tonho, filho de Maria, que casou com José, lá da mercearia?
- Ah, o Tonho. O que tem o Tonho?
- Que Tonho?
- O Tonho, filho de Maria, que casou com José, lá da mercearia.
- Ah sim, o Tonho.
- E então?
- O que foi?
- Você falou do Tonho, filho de Maria, que casou com José, lá da mercearia.
- Ah... Falei?
- Falou.
- Sabe que esqueci?
- Do quê?
- Do Tonho?
- Que Tonho?
- Tonho, filho de Maria, que casou com José, lá da mercearia.
- Ah sim, ele se casou.
- O Tonho.
- Não, José.
- José casou com quem?
- Tonho.
- Tonho ou José?
- Os dois, fugiram depois da missa. Foram para a cidade.
- Que horror.
- Tem linha pra continuar o casaco?
- Tenho.

Trocam linhas, casacos antes um azul e outro amarelo agora são azul-amarelo e amarelo-azul.
- Acho que as crianças vão gostar.
- Eu também acho.
- Mas do que falávamos?
- Tonho?
- Que Tonho?

E o ciclo recomeça.

O encontro de dois mundos.


No estúdio estavam os dois. Face a face, corpo a corpo.

De um lado, no auge de seus vinte anos, com apenas dois dentes na boca e as roupas velhas doadas por seu senhor feudal. Ele era a Idade Média. Ao seu lado estava sua esposa de quinze anos e na segunda tentativa de gerar um filho, já que o primeiro morrera de tifo. Ele observava com curiosidade o sofá e a textura do tecido, melhor que as acomodações de palha cobertas com couro da casa onde morava.

Do outro lado, no âmago de sua forma física um executivo do século XXI, o representante da Idade Contemporânea. Ele vestia um belo terno Giovani, acessava freneticamente seus e-mails corporativos de seu blackbarry e ao seu lado esta sua esposa, com quarenta anos e sem filhos.

- Boa tarde senhores. - Diz o cientista, que inventou a máquina que permitia tal situação.
- Tarde. - Responde a Idade Média.
- Boa tarde, meu senhor. - Diz a Idade Contemporânea.
- Hoje vamos apenas conversar, saber o que cada um pensa. Por quem podemos começar?
- Deixe o caipira começar. - Disse a Idade Contemporânea.
- Bem, vamos então...
- Eu sou a idade média. - Explica. - Vivemos muito bem em minha época, apesar de meu primeiro filho ter morrido de tifo...
- E o segundo morrerá de que? Peste bubônica? - Provoca a Idade Contemporânea, segurando o riso.
- Pelo menos meus porcos não espirram e me matam de medo.
- Medo? Com dinheiro eu compro o remédio.
- Eu não preciso de remédio, a fé funciona e é de graça. - Comemora a Idade Média, apalpando o bolso. - Aliás, nem de dinheiro preciso.
- Tenho carro e você não.
- Tenho cavalo. - Responde de imediato. - E não pago IPVA por ele.
- Temos saúde, chegamos até os cem anos com facilidade. - Gaba-se a Idade Contemporânea.
- Ah sim, apoiados em muletas e bancando filhos sangue-sugas.
- Vocês nem chegam aos quarenta.
- Pelo menos não temos crise de meia idade.
- Vocês pagam tributo ao seu senhor, que em geral é abusivo.
- Mas é apenas um tributo. - Diz a Idade Média, dessa vez se gabando. - Você tem mais siglas de impostos do que letras no seu nome, e para piorar, falam que é para saúde, segurança e educação. Não recebem nenhuma das três. E mais, se eu desconfiar de meu senhor posso simplesmente desafiá-lo para uma luta homem a homem e se vencer minha vontade prevalece porque há a lei da espada.
- Eu posso entrar na justiça! - Berra a Idade Contemporânea. - Temos advogados e leis claras!
- E esperar por anos para descobrir que nada mudou... Aliás, que você está errado e vai ter que pagar por estar certo.
- Como se fosse fácil brigar com seu senhor.
- Mais fácil que saber que é liderado por um crustáceo com um tentáculo a menos e que antes dele foi liderado por uma múmia e que nenhum deles jamais se importou com quem o escolheu. Essa tal de democracia. Pelo menos na idade média sabemos exatamente quem são nossos vilões.
- Como se seus reis e senhores fossem melhores que nossos políticos, com suas visões distorcidas da realidade e o clero que os subjuga e distorce a verdade.
- Quanto a isso me vieram siglas em resposta: IURD e Globo. - Responde a Idade Média. - Em nosso tempo apenas temos a Inquisição... Ah sim, concordo, políticos são um mal, digo mais.
- Você é banguela! - Provoca a Idade Contemporânea.
- Você está gordo de tanto fast food! - Responde de imediato a Idade Média. - Pessoas que nem Sarney seriam decapitadas ou tiradas por poder!
- Mentira, outro igual assumiria o poder. - Discorda a Idade Contemporânea.
- Ao menos se daria ao trabalho de fingir ser nobre. - Desdenha mais uma vez a Idade Média, cuspindo no sapato da Idade Contemporânea, que se revolta.
- Isso é um legítimo Mr. Cat! Tem idéia do preço! - Seu animal!
- Feio!
- Cara de mamão!
- Vou te mostrar quem é...

O cientista separa as duas idades antes que briguem como crianças imaturas.

Apesar de serem muito distantes, ainda assim eram muito próximas e parecidas demais.

O Sorriso de Joana.

 Joana é uma menina especial. Daquelas que dizem que Deus jogou a forma fora ou esqueceu a receita.

Cabelos ruivos, tom de mel. Rosto moreno da raça e um sorriso que torna qualquer sorriso tradicional de todo brasileiro apenas algo fútil. É feliz apenas por despertar e ver no horizonte um pouco de esperança. Caminha satisfeita pelas ruas do centro do Rio de Janeiro. Pasta com documentos debaixo do braço esquerdo e um copo de café na mão direita.

Tem pressa. Como sempre, dormiu demais e não vai chegar ao trabalho na hora certa se enrolar mais. Ela conseguiu um belo emprego na Petrobrás. Trabalhava desde o início do ano no prédio da Petrobrás da Av. Chile.

Agora bate com orgulho no peito, afinal de contas, estudava desde pequena para seguir a carreira de engenharia química e aos vinte e cinco, recém formada, tudo se encaixava conforme o planejado.

Nada estragaria seu dia.

Consegue chegar na hora. O trabalho segue seu rumo tradicional, começando pelo tédio do começo da rotina, ao ritmo frenético sempre perto da hora do almoço e fechando com tranqüilidade nos últimos minutos. Pelo menos era dessa forma que Joana via o trabalho. Para muitos, no entanto, era um inferno da manhã até a hora de chegar na cama. Joana não era assim.

Ao sair da empresa seu celular toca.
- Marcos? - Atende Joana.
- Oi amor. - Responde a voz do outro lado.
- Tudo certo pra hoje?
- Claro, Joana. Comprei os ingressos para o cinema... Trouxe até o da pipoca. - Responde Marcos, com empolgação na voz. - Estou no centro já, me espera aí na empresa que te busco.
- Tá bom, de amo.
- Também te amo.

Joana desliga o celular e respira. Está radiante. Nada parece estragar seu dia. Em cinco minutos Marcos chegaria. Ela retorna para o prédio e entra no banheiro para se maquiar. Quatro minutos depois seu celular toca. Marcos já chegara. Ela corre para o lado de fora e vê do outro lado da rua o pálio de Marcos a aguardando. Ela acena para o amado e atravessa a rua.

Marcos buzina. Ela não entende e de repente seu mundo gira e escurece.

Marcos sai desesperado do carro e vai até ela. Um filete de sangue escorre de seu rosto enquanto um Honda Civic desaparece na avenida com o farol esquerdo quebrado. Marcos pega o celular e liga desesperadamente para uma ambulância. Amigos do trabalho e do prédio cercam-na, consternados com o que acontecera. Joana torna a abrir os olhos e sua mão trêmula procura o rosto de Marcos.

Ela não chora. Ela não lamenta. Apenas continua sorrindo.

Nada estragaria seu dia.

Nem a morte.

Nesse dia Joana partiu, mas sem perder o sorriso.

Cachaça e Paixão.

Ele apenas tinha um copo vazio e um olhar torto. Não fixava a visão em lugar algum e sequer conseguia fixar a mente para se importar. Estava em seu mundo particular e nem mesmo percebera quando o dono do bar o guiara por duas quadras e o abandonou solene em um banco de praça. Seu corpo ardia, mas menos que seu peito. "Marta", era a única coisa que conseguia balbuciar. Não faziam nem cinco horas que encontrara Marta e menos de três horas que ela queimara suas coisas e o expulsara de casa. Uma áspera discussão, ápice de um casamento torpe e que há muitos anos já dera mais do que podia. Mas ele ainda a amava, no fundo mais profundo de seu coração ainda ardia a mesma paixão de dez anos atrás. E ele precisava tentar mais uma vez, apenas uma. Levantou-se trôpego, com o copo na mão esquerda e a garrafa vazia de Velho Barreiro na outra. Arrastou-se pelas quadras em busca de seu antigo lar, movido apenas pela vontade de rever Marta. Pouco a pouco conseguia juntar letras e formar palavras, e quando estava na porta de seu condomínio já conseguia até mesmo falar com o porteiro noturno. - Diaslslaskls, Marta! - Falou. - Boa noite pro senhor também. - Respondeu o perteiro, alheio ao idioma da cachaça. Pegou o elevador até o sétimo andar e após cinco tentativas frustradas conseguiu finalmente encontrar a porta de casa. Adentrou sorrateiramente, pelo menos achava, e caminhou pela sala. Não notou a presença de um capacete azul escuro e um estranho casaco de couro marrom sobre a mesa de jantar, mesmo esbarrando em ambos. Chegou até o quarto e viu Marta, dormindo nua sob os lençois. Ela tinha um sorriso satisfeito e nada lembrava a mulher que horas antes o expulsara de casa. Menos entorpecido escuta a voz de alguém cantando no banheiro. É uma voz familiar, mas que não reconhece mesclada ao som da água. Entra no banheiro e vê um homem tomando banho. Tomado de ciúme e cego de ódio ele abre subitamente a porta, ergue sua garrafa e golpeia o homem com a garrafa de Velho Barreiro. Uma. Duas. Cinco pancadas. O sangue escorre pelo chuveiro. Sangue, vidro e ossos do homem que agora está caído no banheiro com um rombo na nuca do tamanho de uma palma e o rosto completamente desfigurado pelos cacos do vidro da garrafa que se despedaçara na primeira pancada. Ainda tomado pela raiva cambaleia até o quarto de sua esposa e a acaricia. Ela blabucia seu nome, o que apenas aumenta ainda mais sua raiva. Marta desperta e a última visão que tem é a de seu amado. Em seguida tudo escurece enquanto as mãos fortes e raivosas agarram seu pescoço e a estrangulam. Sem mais nada a pensar e a fazer ele se ergue. As mãos maculadas pelo ódio tocam seu rosto e o sujam de sangue. Agora está completamente sóbrio, trazido do mundo da bebida pelo ardor da fúria. Caminha até a sala e finalmente nota o casaco marrom e o capacete. Uma carta cai do casaco. Ele a lê, e lágrimas escorrem de seu rosto. Em seguida pula do sétimo andar para a morte. A libertação. No dia seguinte jornais noticiam: - Matou esposa e filho, depois se suicidou. E caída no chão, estava um singelo pedaço de papel...
Pai, Como você não chegou a tempo, eu decidi escrever essa carta mesmo. Provavelmente quando acordar de manhã já terei pego minha moto e partido. Consegui finalmente me curar daquela terrível doença. O médico informou que não precisarei mais comparecer as sessões de quimioterapia e que se as coisas continuarem desse jeito me dará alta completa até o final da semana. Mamãe me contou da briga que tiveram, mas relaxe. Ela o ama, e conversei com ela a respeito. Amanhã espero que estejam bem melhor, não quero pensar que minha doença tenha acabado com o casamento de vocês. Não vai ser uma briguinha que vai acabar com um casamento de anos, ainda mais agora. Te amo, pai. Cuide bem da mãe.
Inserido a pedidos do Lestat.

O Parque Sombrio - 5

- Me dá mais uma da boa! - Berra Abreu, com o copo vazio de cerveja. Sentado em uma mesa do Bar do Zeca, um boteco local, o médico e legista Abreu não parece se incomodar muito em esperar dias na Ilha de Paquetá pelos resultados de testes de amostras retiradas das vítimas do Parque Darke. Ele está completamente embriagado e aos beijos com uma mulher que aparenta idade para ser sua mãe (sendo que ele tem quase cinqüenta anos). Naquele momento em específico ele faz aquilo que sabe fazer melhor: torrar dinheiro público. Não que Abreu seja corrupto, mas ele conta nos dedos quantos não se aproveitaram de esvaziar cofres públicos em diligências optando em comer em locais baratos ao invés de só usufruir do bom e do melhor. "Considerando nossas condições de trabalho, é nada mais que justo", respondia quando questionado sobre suas práticas onerosas dando a entender que o estado precário do IML era justificativa para seus atos. Quando chega quase uma hora da manhã Zeca, o dono do bar, de forma educada convida todos a se retirarem. Abreu, ainda abraçado da mulher, se levanta e pede apenas mais uma cerveja pra viagem, sendo atendido prontamente. Zeca preferia se livrar do bêbado do que manter um casco de vidro - pelo qual cobrou. Abreu retoma caminhada com sua parceira e caminham até a Praia da Guarda. Excitados pela bebedeira os dois se sentam um banco a beira da praia e começam carícias mais ardentes. Beijos e gemidos se manifestam e um seio já está a mostra quando escutam o som baixo da viatura de polícia. Imediatamente os dois se recompõe e se levantam ao mesmo tempo que a polícia passa e os ilumina com a lanterna. Um dos policiais reconhece o médico. - Vai São Jorge! - Berra o policial, gargalhando com o amigo. - Vamos para algum lugar mais íntimo? - Propõe a mulher, lambendo a orelha de Abreu. - O que sugere? - Pergunta, tomando em seguida um gole de cerveja. - Vamos pro Darke? - Fala a mulher, apontando para o Parque, completamente escurecido. - Mas... - To vendo que vai brochar, não é? - Nem pensar! Os únicos mortos que Abreu manipula são os do IML! Eu sou muito vivo! Vamos para lá... Você nunca vai se esquecer dessa noite! O casal cambaleia pela noite em direção ao Darke. Uma caminhada que levaria apenas cinco minutos de onde estavam leva quase quinze por seus estados físicos e mentais. No caminho Abreu propõe que se agarrem na praia, mas a rampeira insiste em fazerem tudo no parque. "Lá é mais gostoso porque é proibido.", provoca enquanto coloca a mão dentro da calça do legista. Com rapidez e experiência a moça pula o muro seguida por Abreu. Caminham pela área livre do parque até que chegam ao local onde o corpo de Isabela foi encontrado. Um pouco de náusea tomou Abreu enquanto continuavam e avançavam rumo a trilha que levava ao mirante. A trilha foi percorrida em menos de sete minutos, entre tropeços e gargalhadas bêbadas. Mal chegaram ao Mirante a blusa da rampeira foi tirada e Abreu já passeava entre seus seios. Foi um sexo selvagem e sem muita preocupação. Estavam completamente sós e as únicas testemunhas do ato eram animais e o céu estrelado daquela noite. De repente Abreu tem a impressão de escutar um galho se partindo. Retira a boca do ventre da mulher e olha para os lados. - Você escutou? - Pergunta o médico. - Escutei o que? - Responde, ofegante de prazer. - Um galho se partindo. - Está maluco doutor? Vamos continuar! Abreu retoma os afazeres e novamente escuta o som, dessa vez mais perto. Se levanta e procura por alguma arma entre suas coisas. "Merda! Esqueci o 38 no hotel!", pensa enquanto sua parceira se levante contrariada. "Tá chapado?", pergunta revoltada enquanto veste a calcinha. - Cala a boca e escuta! - Bronqueia Abreu, agarrando o braço dela e olhando nos olhos dela. - Escuta! Nenhum som. Nada. A mulher se afasta de Abreu e veste o resto da roupa. "Você é um filho da puta! E maluco! Tinha que ser doutor de defunto mesmo...", reclama a moça quando finalmente escuta o terceiro galho se partir. - Abreu? - Agora escutou sua puta! - Fala o médico, armando-se com a garrafa vazia de cerveja. - Eu disse que esse lugar era ruim, mas você me escutou? Claro que não. Me agarrou pelo pau e me trouxe aqui. Feliz agora? - O que é? - Sei lá o que é, mas está nos observando... Vamos sair daqui com cuidado, sem correr. Abreu começa a caminhar, seguido pela mulher. Atento e com o sangue frio de quem lida com o que há de mais bizarro na raça humana há anos ele parece tranquilo. A garrafa lhe dá uma falsa segurança, que reforça pegando no chão um galho grosso de alguma árvore. A rampeira o acompanha e quase o abraça enquanto descem a trilha com cuidado. Um novo som se escuta próximo deles e uma fruta atinge a mulher, que desesperada desvencilha-se de Abreu e corre pela trilha, desaparecendo aos bwerros. - Merda! - Reclama o legista, ficando só. O legista caminha atento, em parte nervoso pelo abandono e no fundo mais calmo por não ter nenhum empecilho ao lado. Ele não é incomodado por toda a descida. Apenas se dá conta que está completamente nu quando chega no fim da trilha. "Merda! No susto deixei as roupas lá em cima!", pensa enquanto decide se retorna ou não para buscar ao menos as calças. - Abreu! - Berra uma voz conhecida se aproximando. - Fred! - Reconhece Abreu, escondendo as partes íntimas com a garrafa semi-transparente, o que não é exatamente a melhor solução. - O que houve com você? - Pergunta o policial. - Estava comendo e escutei um barulho, fui conferir. - Comendo pelado? - O que se come pelado, Fred? E você, também veio comer? - Estava procurando evidências com o Almeida. Escutei um eco estranho vindo do Mirante e vim para cá, o Almeida ficou do outro lado, ele só precisa de uma ligação minha pra vir. - Aquela vadia berrava muito alto, parecia uma vaca no cio... - Responde o médico. - Eu estava comendo lá em cima. Pode me acompanhar até lá? Preciso pegar minhas coisas. O médico segue o caminho de volta acompanhado dessa vez de Fred. A presença do amigo transmite um pouco de segurança. Caminham silenciosos, até porque Abreu está completamente envergonhado por sua situação ridícula. Ele chega até o Mirante e suas roupas continuam no mesmo local, intocadas. Veste a cueca e as calças e se sente menos mal, Fred o tempo todo observa atentamente. - Pelo visto foi uma senhora noite. - Comenta Fred, sentindo o cheiro forte de cerveja e do alcóol. - Era uma boa mulher. - Pena que não a vi. - Como assim? Ela saiu correndo na minha frente... Você com certeza a viu correndo pelo parque até a saída. - Não vi mulher alguma sair da trilha. Por um instante Abreu gelou por dentro. Continua... Outras Partes de "O Parque Sombrio": - Parte 1; - Parte 2; - Parte 3; - Parte 4; - Parte 5 (novo);

O Parque Sombrio - 4

Dois corpos. Fred e Almeida observavam com espanto o segundo corpo no necrotério improvisado no hospital de Paquetá. Era um jovem de pele clara, cabelos negros lisos aparentando dezesseis anos. Nele tinha as mesmas marcas de hematomas da primeira vítima. O legista Abreu observa os amigos com o costume mórbido de quem há anos faz esse serviço, enquanto em paralelo termina com seu sanduíche. - Porque não nos falou dele antes? - Pergunta Almeida a Dr. Abreu. - Porque foi encontrado quando estavam na barca. - Responde. - Em uma hora e vinte muita coisa acontece. - Percebo. - Fala Fred. - Qual o nome dele? - Marcelo. - Responde Almeida, com lágrimas nos olhos. - Ele é meu amigo de infância. - Deus! - Brada Fred, assombrado. - Eu vou pegar esse filho da puta, parceiro... Vou lhe arrancar os bagos pela boca, eu prometo. Almeida afasta-se do corpo de Marcelo e apoia-se em uma pilastra. Fred o ampara, preocupado com o envolvimento de Almeida no caso. "Espero que consiga manter as estribeiras", pensa enquanto observa Dr. Abreu cobrir novamente o corpo. - Só existe uma diferença entre esse corpo e o outro. - Diz Abreu. - Qual? - Pergunta Fred. - Ele não tem a marca nas costas. E pelo que vi, Marcelo sofreu violência sexual... - Um assassino gay? - Pergunta Fred. - Não tenho certeza, encontrei marcas de... bem... ferrugem. - Fala o médico, sem jeito de como falar do estado do amigo de Almeida. - Provavelmente o dano foi causado por um objeto irregular e enferrujado, um cano velho ou sei lá qual objeto, pois não tinha nenhum no local onde o encontramos. - E onde o encontraram? - No Darke, como disse há pouco, na trilha para o outro mirante. Estou esperando alguns testes chegarem do continente para confirmar algumas suspeitas minhas. - Quais seriam? - Questiona Almeida, quase recuperado. - Que temos dois assassinos, e não apenas um. - Uma ilhota de merda e dois assassinos? Deve ser coincidência, Abreu. Não tem como ser... - Fica calmo, ainda é apenas uma suspeita. Só saberei quando os resultados chegarem, até lá vou curtir uns dias em Paquetá às custas do estado. - Curtir? Você vai é se afogar em cachaça... - Isso também! Sem mais o que conversarem com Abreu eles saem da sala. Almeida e Fred fazem anotações em seus blocos e decidem juntos ir até o Darke de Mattos procurarem pistas. Almeida nesse momento se tornava um trunfo no caso, por ser antigo morador, e com a morte de um amigo de infância o crime deixara de ser apenas mais um caso e se tornara pessoal. O parque já estava fechado desde as dezessete horas, e chegando as dezoito horas não conseguiriam nem encontrar um funcionário no portão. "Não se preocupe, é só pular o muro.", comenta Almeida, enquanto caminha pelo entorno da entrada e encontra rapidamente uma parte do muro possível de pular. Fred reluta um pouco, mas acaba cedendo a curiosidade. Em poucos minutos os dois policiais invadem o parque e caminham com calma pela escuridão que a cada minuto fica mais forte. - Isso vai dar merda. - Sussurra Fred. - Porque? - Questiona Almeida. - Faço isso desde pirralho, e pelo menos metade dessa ilha foi fabricada aqui. O Darke a noite é um verdadeiro motel! - Mas nós somos policiais! Deveríamos ao menos ter pedido autorização ao administrador daqui. - Você o viu? - Não. - Nem eu, então vamos até a segunda trilha logo, procuramos pelo tal cano de ferro e vamos embora daqui. Trouxe lanterna? - Só celular. - Eu trouxe, então não atrapalhe, ok? - Almeida saca uma pequena lanterna de bolso e ilumina o rosto de forma sinistra. - Eu sou o assassino do Darke! Buuuuuuu! - Qual a sua idade Almeida? Dez anos? - Em cada perna. - Responde Almeida. - Fred, já te falei que você é muito babaca? - Hoje ainda não. Os policiais chegam sem serem pertubados rapidamente ao início da trilha do segundo mirante. Menos fanfarrão Almeida passa a utilizar a lanterna do jeito tradicional e segue a trilha deixada pelos policiais militares quando recolheram o corpo. Depois de alguns metros subindo chegam ao mirante e encontram a marca de giz no chão feita pelos primeiros peritos. - Consegue ver aqui no escuro? - Pergunta Almeida, sem saber se o ângulo da lanterna é bom para o amigo. - Consigo, além da lanterna a noite está clara por causa da lua. - É verdade... - Balbucia Almeida, observando a lua cheia sem dar muita importância. - Fred, onde você colocaria uma arma de crime? - Porque me pergunta isso? Eu não sou o assassino... - Mas você tem TOC, e loucura por loucura serve a sua... Depois de quase uma hora de procura minuciosa nada é encontrado. Nenhuma pista foi deixada pelo assassino, nenhum galho quebrado significativo e nem mesmo uma pegada existe que não as das botas policiais. "A pior merda que tem aqui nesse país é ser investigador! Proteger a cena do crime e nada são sinônimos...", reclama Fred enquanto sobe o mirante e observa o parque do alto. - O que seus olhos policiais podem ver? - Eu vejo... nada! - Eu... A frase de Almeida é interrompida pelo eco de uma gargalha sinistra. Os dois não estão sozinhos. Continua... Outras Partes de "O Parque Sombrio": - Parte 1; - Parte 2; - Parte 3; - Parte 4; - Parte 5 (novo);

O Parque Sombrio - 2

O sol ardia as quinze horas da tarde daquele dia. Como sempre o trânsito do centro do Rio de Janeiro estava caótico e buzinas soavam famintas aumentando ainda mais a sensação de calor em todos os motoristas infelizes que tinham que passar por aquela região. Não haviam pessoas satisfeitas, não havia o sorriso lendário do rosto carioca. Apenas um ou outro conseguia sorrir, mas esses com certeza não eram motoristas... - Odeio essa cidade. - Comenta Almeida, enquanto dirige seu santana preto de placa branca pela Av. 1° de Março. - Mas adora as putas. - Responde Frederico, ou apenas Fred, seu companheiro. - O que tem as putas a ver com isso? - Brada o homem. - Nada, mas achei engraçado falar isso... Você tem menos de vinte e três anos e reclama como uma velha rabugenta! Já pensou o que vai fazer quando chegar aos trinta? - Com certeza não vou dirigir aqui nessa merda de cidade... - Sabe onde você deveria morar? - Onde? - Em Paquetá! - Paquetá é meu ovo esquerdo Fred! - Grita Almeida, socando o volante. - Deus me livre voltar para àquele lugar! Onde já se viu? Aquilo fede a bosta de cavalo... - Mas era lá que morava antes de entrarmos na Civil... - Isso mesmo! Antes! E nunca mais ponho os pés ali! Cinco horas da tarde Almeida e Fred estão em Paquetá. Saltam da Barca Charitas, que surpreendentemente fizera a viagem em uma hora acompanhados por repórteres e os mais diferentes tipos que se movimentam em busca de alguns minutos de fama. Fred sorria irônico para Almeida, lembrando do rádio dos superiores lhes mandando para Paquetá. Os dois saíram da barca de maneira discreta, subiram em um eco-táxi* e metros depois saltaram no hospital local, que ficava a menos de uma quadra da estação de Barcas. - Porque me fez gastar dinheiro a toa, Almeida? - Reclama Fred, pagando ao eco-táxi pela viagem inútil. - Foi divertido... Precisava reaver meu bom humor. Seis reais nem é tão caro assim. - Vai te a... A frase não se completou. Foram recebidos com fervor pelo Doutor Abreu, um legista de fora e conhecido dos dois policiais. Era um senhor de aparentemente quarenta anos mas cabelos grisalhos quase brancos. Vestia um avental branco com algumas gotas de sangue espalhada e no peito tinha um crachá com o logotipo do Instituto Médico Legal. Pela situação rara e inconveniente, para evitar mais disse-me-disse da Imprensa o próprio IML optou por fazer tudo em Paquetã. - Que bom que vieram. - Comentou Dr. Abreu, estendendo a mão para Almeida, sem notar que ainda estava com a luva cirúrgica. - Abreu, a luva. - Indicou Almeida, causando certo constrangimento a Dr. Abreu, que imediatamente se livrou da luva com os dentes e a descartou no chão do hospital sob olhares de reprovação de pessoas no local. - Para que servem serventes? - Comentou, sem maldade. - Vieram ver a menina? - Claro Abreu.. - Diz Frederico. - Porque mais estaríamos aqui a essa hora? - Almeida não é daqui? - Pergunta Dr. Abreu. - Pelo amor de deus! Eu saí daqui fazem dois anos! Agora moro em Copacabana! Co-pa-ca-ba-na! - Soletrou Almeida. - Que seja! Venham comigo... O hospital Manoel Artur Villaboim era um hospital simples. Possuia três entradas. A da emergência pela esquerda, a central que dava nos quartos e uma na direita levava aos consultórios. Abreu guiou os policiais pela entrada da emergência, que ficava um pouco mais para dentro do terreno do hospital. A ala de espera tinha apenas os familiares da vítima - que os policiais reconheceram pela tradicional face da perda, expressão já velha conhecida. - e uma mãe que parecia esperar um filho. Não havia ainda sinal da imprensa, por sorte. No final e a esquerda da sala de espera estava a porta dupla que dava acesso ao interior do hospital. Dr. Abreu abriu a porta com já certa intimidade e avançou pelos corredores azulejados de azul até uma ou porta de madeira pintada de branco - mas mal conservada. - identificada como "CTI" ou algo parecido. Abreu fez o sinal da cruz em seu peito e entrou, sendo acompanhado pelos homens da lei. - Desculpem a bagunça. - Comentou Dr. Abreu, enquanto cobria o cadáver de Isabela com um lençol, mas não antes que Almeida e Fred a vissem ainda com as víceras expostas. A sala parecia bagunçada como Dr. Abreu comentou, mas era uma bagunça anterior a sua passagem e ainda assim mais arrumado do que a área do necrotério onde ele habitualmente estava. A primeira coisa que Almeida e Fred deram falta, e não lamentaram, foi do tradicional cheiro de pobre do IML, ausente naquele quarto. A única bagunça de Dr. Abreu podia ser constatada por uma mesa de instrumentos cirúrgicos ensopados de sangue e um pequeno coração acomodado em uma bacia de alumínio. - Demoraram a chegar. - Comentou o médico, pegando um pequeno gravador. - Soubemos depois da barca de 13:30, só pudemos vir na de 16:00. - Responde Almeida. - Ainda bem que vim cedo e tirei fotos do lugar! A essa hora já deve ter se transformado em ponto turístico desse povo sádico. - Comenta o médico, enquanto coça a cabeça sem perceber que estava com a mão suja de sangue e sem luva. - Querem as fotos agora? - Não. - Disse Fred, agradecendo com um gesto. - Manda por e-mail... Já era, espero apenas que a trilha esteja interditada. - Ah, isso está sim. - Afirma Dr. Abreu, com veemência.- s pessoas podem conseguir pular muros, mas com apenas três entradas para a trilha do mirante sudoeste protegidas pelos GMs nada passa. - Exiistem dois mirantes no Parque Darke. - Explica Almeida ao colega. - Mas e o que sabe? - Questiona Fred, satisfeito com a curta explicação de Almeida. - Bem, vamos começar pelos hematomas... Ela não apanhou, as marcas foram resultado de outros fatores. O suspeito provavelmente a arrastou pelo parque sem muido cuidado e a trouxe para o trono, enquanto a despia pelo caminho. Também não houve abuso sexual e ela morreu de afogamento. - Afogamento? - Sim, os pulmões dela estavam cheios do próprio sangue... - Falou Dr. Abreu, retirando o lençol de sobre a vítima e virando-a de costas. - Sangue que entrou por aqui! Havia uma perfuração nas costas da menina exatamente na altura do pulmão esquerdo. Era um corte horizontal e profundo. Dr. Abreu fez questão de mostrar a perfeição do ato, que parecia possível apenas com aço cirúrgico ou algo muito afiado. Almeida e Fred observaram intrigados o ferimento, que parecia dizer muito mais do que apenas trasmitir a forma de assassinato. Dr. Abreu percebeu o espanto dos amigos policiais, cobriu novamente o corpo e com sarcasmo voltou a falar: - Eu acho que ela foi a primeira. - Comenta o médico. - Por que seria? - Questiona Almeida, temendo o ponto de vista do médico e amigo. - Porque acharam mais um corpo... No outro mirante! Continua... * Bicicleta de turismo com três rodas, pilotada por um jovem de pernas fortes e que possui uma pequena área estofada na parte traseira onde duas pessoas se acomodam. Outras Partes de "O Parque Sombrio": - Parte 1; - Parte 2; - Parte 3; - Parte 4; - Parte 5 (novo);

O Parque Sombrio - 1

A Ilha de Paquetá é uma pequena ilha localizada no centro da Baía de Guanabara, estado do Rio de Janeiro, e ligada à cidade apenas através de barcas pegas na Praça XV de Novembro, na cidade do Rio de Janeiro. Um local bucólico e ao mesmo tempo belo, palco de ilustres visitantes como Dom João VI. Uma de suas principais atrações turísticas é o Parque Darke de Matos, um recanto de beleza sem igual situado ao sul da Ilha. O dia estava ensolarado naquela tarde de Janeiro em Paquetá. Pássaros cantavam e crianças brincavam no gramado do parque. Isabela completara dezesseis anos dois dias antes, e passeava exuberante no vestido de renda que ganhara da mãe. Religiosa e responsável costumava estudar nas tardes livres em um dos mirantes do Parque. "Ali me sinto mais perto de Jesus", dizia quando questionada. Carregando seus livros de português perdeu a noção do tempo e não notou que os risos das crianças cessaram e que aos poucos os pássaros sumiam. Apenas percebeu o avançar da noite quando ficara difícil ler e voltou a realidade. Olhou seu celular e viu que já passavam das seis da tarde, e em muito pouco tempo escureceria. Assustada e com medo de ser encontrada por algum guarda municipal (não queria levar bronca), pegou suas coisas e desceu pela trilha que subira horas antes. Enquanto corria sua respiração pesava mais e mais e sentia um nervosismo maior na medida em que escurecia cada vez mais rápido. Sem prestar atenção acabou tropeçando em um galho solto e caiu com as nádegas no chão. Riu consigo mesma pelo medo que sentia e levantou-se rápido, limpando com rapidez a terra de sua saia. "Estou em Paquetá! Deixa de ser nervosa... Rasguei o vestido...", diz para si mesma percebendo um pequeno furo na ponta da saia. CRAC! O som interrompe sua mente e a deixa preocupada. Não é algo normal para a hora. Seria um galho quebrado? Um lagarto? A dúvida assombra a mente de Isabela, que começa a caminhar mais rápido. Deixa para trás seu material de escola, com a mente ocupada pelo som. CRAC! Não foi um acidente. Foi proposital. Isabela retoma a corrida, agora mais assustada ainda. Não se dá conta do cenário a sua volta e nem se preocupa com mais nada além de correr. Novamente se desequilibra, mas consegue retomar o passo até que chega a uma bifurcação. Se estivesse em condições normais lembraria que o caminho da esquerda era o que a levaria para o final da trilha, o da direita a guiaria para uma parte dos túneis do Darke de Matos. Sua mente pensa em... CRAC! Escolher? Com o som mais proximo? Ela segue seu rumo natural (é destra) e chega até uma pequena clareira com três túneis parcialmente obstruídos pelo tempo. Lendas e causos Paquetaenses dão conta que eram antigos depósitos de corpos de escravos. Isabela está nervosa demais para se lembrar desses detalhes. Vira-se para tentar fugir quando algo lhe atinge a cabeça. A última coisa que vê é a luz do luar quando seus olhos procuram o céu e a salvação por Cristo... No dia seguinte seu corpo é encontrado no parque. Isabela foi abandonada em um pequeno palco que existe na parte central do Darke.. Está sentada em uma cadeira escavada na pedra. Completamente nua e com diversos hematomas que deixam claro que foi violentada, mas suas mãos estão encostadas e fechadas em formato de concha, com um pequeno papel mantido firme entre elas. Os policiais não se arriscam a tocá-la antes da chegada dos legistas, apenas se ocupando em manter curiosos distantes. Os pais dela chegam e choram. Tentam tocá-la mas são impedidos pelas autoridades. Lágrimas escorrem, pois Isabela era querida por todos na Ilha, e agora nunca mais poderia realizar seu sonho: ser professora. E Isabela não seria a última... Continua. Outras Partes de "O Parque Sombrio": - Parte 1; - Parte 2; - Parte 3; - Parte 4; - Parte 5 (novo);

Vinho e Corpos Ardentes.

Ela caminhava sem pensar no dia seguinte com algumas compras de natal. Seu corpo exaltava a beleza de seus vinte anos incompletos e seus longos cabelos bem cuidados ressaltavam ainda mais a rigidez de seus seios cobertos apenas por um vestido vermelho. Não havia rubor em seu rosto ou mesmo pensamentos maldosos em sua mente, na sua cabeça era apenas um vestido simples, vermelho liso que chegava até seus joelhos. Nos olhos de quem a observava era algo um pouco mais complexo.
Chegou em casa apressada. Não demoraria muito e sua novela favorita começaria. Eram apenas duas da tarde, a novela começava as nove da noite. Preencheria esse tempo dedicando-se a algumas conversas no computador e um pouco de cochilo. Jaqueline, ou simplesmente "Quel" como era chamada pelas amigas, curtia as primeiras férias em dois anos de trabalho duro em uma firma de administração de imóveis no centro de sua cidade. Quel caminhou perene até seu quarto e sentou-se na cama. Com calma despiu-se do vestido vermelho e olhou-se no espelho, como sempre fazia. Tocou seus seios ainda rijos da idade e sorriu marota para si mesma. Ela sentia o desejo querer escorrer por suas pernas, mas não tinha nada ou ninguém que lhe fizesse companhia. E nem teria. Era dia 24 de dezembro, sua família morava toda em outro estado e esse ano, devido a escala de seu trabalho só viajaria no ano novo. Seria um natal solitário, ao menos por enquanto. Apenas vestida de calcinha caminhou até a sala e sacou da geladeira uma garrafa de vinho tinto. Não era a melhor marca do mercado, e particularmente lixava-se para valores sociais em casa. Se fosse Don Perignon ou apenas um Sangue de Boi beberia daquele que estivesse mais de acordo com seu humor. Essa era a noite do "Boá". Pegou um copo de vidro sem requinte, encheu-o até a borda e tomou de um gole só. "Delícia!", comemorou enquanto sentia algumas gotas escorrerem por seu corpo. Tornou a encher o copo e foi para o computador. Não havia ninguém online, ao menos não interessante, apenas os mesmos colegas nerds incapazes de largar o computador pra se socializarem, mas nenhum eventual pretendente. A webcam lhe parecia cada vez mais ousada a cada gole. O tempo passou rápido demais. Já era noite quando saiu do computador sem conseguir mais do que conversar e bloquear em definitivo um qualquer que usava o nick "$$WARCRAFT É O PODER$$". Foi até a janela e observava de sua janela o vai e vem dos últimos carros transportando os atrasados do natal. Respirou fundo e lamentou que essa noite não teria nenhuma ave no natal. Caminhou até sua cama e deitou-se. Foi quando notou que não estava sozinha. Sentiu uma estranha vibração nos pés parecida com dedos tocarem seus pés. Sentiu-se aflita, pois poderia estar muito mal. De repente os dedos continuaram a subir e um estranho vulto enegrecido formou-se diante de si. O vulto possuía braços com contornos femininos e uma leveza e suavidade no toque que transformavam o medo de Quel em prazer. Deixou-se dominar pela estranha força e não ofereceu resistência quando a sombra arrancou-lhe a única peça de roupa que vestia e transformava sua calcinha em meros fiapos espalhados pelo quarto. Sentiu-se finalmente penetrada pelo vulto e seus olhos reviraram. Seus seios eram mordiscados com perfeição e cada espasmo a levava para mais alto. Seus olhos se reviravam, queria se contorcer ou berrar, mas o vulto a impedia de fazer qualquer movimento. E essa imobilidade apenas aumentava seu prazer. De repente Quel sentiu-se extasiada e deu um berro de prazer. De repente tudo parou. Sua cama estava completamente encharcada por seu suor e seus fluidos. Não havia sinal algum da presença misteriosa, apenas via a garrafa abandonada de vinho no chão e os primeiros raios do sol penetrando por sua janela, iluminando seu corpo ainda rígido dos tórridos momentos. Levantou-se decepcionada. Era bom demais para ser verdade. Ergueu-se nua e caminhou para o banheiro. Enquanto andava notou alguns sinais estranhos. Sua calcinha estava realmente despedaçada no chão, ao seu lado na cama havia a silhueta de outra pessoa, que lembrava-se uma outra mulher. E seu maior susto ocorreu quando foi ao banheiro. Havia um forte vapor nele, como se alguém tivesse acabado de sair de um banho fervente. Sobre a mesa do banheiro flores brancas jaziam abandonadas e desenhado no vidro do espelho uma única mensagem: "Foi ótimo." E abaixo da mensagem nenhuma identificação, apenas um traço. E mais nenhum vestígio da presença de uma segunda pessoa, nenhuma pegada, nenhuma marca, nenhum sinal de arrombamento na porta. Nada. Apenas uma estranha sensação em Quel de que a observavam. Quel dormiu fora de casa nas noites seguintes ao que foi seu melhor natal

Revelações de Jonas: Sétima Fase da Viagem


Revelações de Jonas
Sétima
Fase da Viagem
Epílogo



Jonas despertou sabe-se quanto tempo depois naquele mesmo desfiladeiro. Como da primeira vez, estava nu. Sua cabeça doía muito e lembrava vagamente de seus últimos momentos na Terra. Lembrava do anjo chamado Sônia e de Albano matá-lo pela traição. Mas uma coisa ainda martelava em sua cabeça, se sua visão tinha se tornado realidade. A forma carnal de Fernando o abandonara por completo, deixando apenas a forma de Jonas.

Com a destreza de quem passeara por aquele ambiente diversas vezes, Jonas literalmente voou pelo desfiladeiro em direção a enorme montanha vermelha onde nela ficavam acampadas as tropas de Dragon. Ao chegar nada encontrou que senão os restos do enorme acampamento. “Droga, eu falhei...”, balbuciou Jonas preparando-se para procurar pela prisão do Devorador de Almas. Quando alça os céus, vê um homem vindo do enorme deserto caminhar em sua direção. O homem tem o corpo completamente coberto por um manto cinza escuro, e uma estranha aura pálida e fria cobre uma área de pelo menos dois metros em torno dele, gerando uma tênue, mas visível, névoa. Jonas sente uma estranha familiaridade no homem, mas não consegue imaginar de onde o conheça, e pousa para obter informações. Antes que o jovem possa dizer algo, o homem dá início a conversa:
– Então você é o espírito de luz chamado de SanoDji? – Pergunta o homem.
– Sim, e quem é você? – Pergunta Jonas, intrigado.
– Trago informações... Da Terra. – Falou o homem, ignorando a pergunta.
– Eu perguntei seu nome, não o que faz... – Interrompeu Jonas, áspero.
– Você quer saber o que aconteceu ou quer saber meu nome? – Falou o homem, elevando o tom de sua voz de forma tal que refletiu no frio, tornando-o mais intenso.
– Então me diga.
– Seu amigo não explodiu a usina, todos estão bem... Se é o que lhe preocupa. Você não falhou em sua missão.
– Como assim não falhei? Eu morri!
– E era exatamente essa sua missão... Servir de alvo.
– Como assim?
– Simplesmente desse jeito que falei, você serviria de alvo enquanto o verdadeiro agente agiria.
– Então quer dizer que a Sombra me usou?
– Exato, o tempo todo... Mas pense, foi por uma boa causa... Pelo menos a causa que interessava a ela.
– E porque você veio me dizer tanta coisa?

“Porque ele é intrometido”, interrompeu a Sombra, surgindo no meio dos dois como por mágica. O homem de manto cinza escuro reagiu ríspido a presença da entidade, fazendo com que o frio no local aumentasse tanto que um espírito comum teria sofrido sua morte final naquele momento. A Sombra apenas exibiu seu enorme sorriso pálido e se enroscou em Jonas.
– Você sabe que existe um contrato, Archeron. – Comentou a Sombra, deixando propositalmente o nome escapar. – Você ainda não aceitou muito bem o que aconteceu... Sabe muito bem que não é minha responsabilidade tudo que aconteceu.
– Quem é “Archeron”? – Pergunta Jonas.
– Amigo do Devorador, de antes dele reassumir seu lugar na ordem natural das coisas... Ficou triste porque quando tudo aconteceu seu nome e o de sua família foram usados pelas pessoas envolvidas. – Explicou a Sombra, sem dar em detalhes.
– Pessoas com que se associou, pelo que vi. – Respondeu Archeron, que mesmo com seu nome revelado, não retirava o capuz.
– Negócios, apenas negócios... Admita, até mesmo você e seus semelhantes saíram ganhando... Todos saíram ganhando.
– Não todos. – Balbuciou Archeron.
– E quem se importa com o gado? Pobres almas que somente servem para alimentar o ego tanto das borboletas quanto das lagartas! Tanto o lado que se diz bom quanto o que afirma ser ruim, todos no fundo só querem saber disso... De inflar seus lindos egos. Eu, ao contrário, não vejo os comuns como gado, vês Jonas? Chegou um mero bezerro em meus domínios, e agora se tornou um minotauro...
– Minotauros vivem presos em labirintos sem saída... – Interrompeu Archeron.
– Bem fortuita sua interrupção. – Respondeu a Sombra, mas sem dar importância. – Agora, já fez das suas e já falou o que queria. Agora suma daqui... Já está incomodando meu pupilo.
– E se eu quiser ficar?
– Serei obrigado a falar mais coisas a ouvidos não treinados, deseja criar mais problemas a seu lado?

Archeron cessou seu diálogo. Era demais escutar tal ameaça proveniente de alguém que era incapaz de admitir seus erros. Mesmo que no momento o erro fosse a arrogância. Deixou-se cobrir por uma densa nuvem esbranquiçada e abriu seus dois pares de asas azuladas. Jonas tentou ver o rosto por destras da névoa, se esforçou, mas apenas conseguiu distinguir dentre a neblina uma máscara de prata que cobria grande parte do rosto, tornando-o completamente irreconhecível, isso se Jonas o conhecesse. Quando a figura alada desapareceu nos céus enevoados, Jonas contou alguns segundos e voltou-se para a Sombra:
– Um dia você vai me contar tudo sobre essa sua linhagem. – Afirmou Jonas.
– Um dia que não é hoje, é outra história para outra época. – Respondeu a Sombra. – No momento vou me restringir a dizer algumas coisas que aconteceram nos últimos seis meses.
– Seis meses?
– Sim, foi o tempo que levei para resgatar sua alma dos abutres que estavam cercando a Usina... Você não se lembra, mas quando Albano te matou, você passou pelo choque da morte violenta e por muito pouco um dos chacais do inferno não o devorou. Para sua sorte Sônia chegou alguns segundos depois e foi uma refeição muito mais saborosa, diga-se de passagem... Garanto-te que ela se debateu muito.
– E porque Albano não destruiu tudo? O tal do Archeron disse que ele era agente deu... É verdade?
– Completamente. Lembra que eu te disse que tinha mais dois agentes? Bem, eu disse que havia falhado, ao criá-los, mas não disse tudo... Albano foi a matriz. Depois dele tentei gerar mais dois, fracassei, então criei você e tive sucesso.
– Sucesso? Mas eu morri?
– E era essa mesma a intenção. Eu e meu aliado sabíamos que se Albano fosse sozinho ele seria descoberto mais cedo ou mais tarde, ele era bom demais. Então Dragon aconselhou que usássemos a velha tática do Boi-de-Piranha. Albano foi informado que quando o momento certo chegasse, ele veria o sinal de que deveria executar suas verdadeiras ordens.
– E que sinal era esse?
– A tatuagem em seu braço. Sônia foi estúpida em destruir suas roupas, mas sabíamos que cedo ou tarde Albano as veria. E as viu. Sabendo o que tinha que fazer ele matou Sônia e foi para a Sede da Organização na Av. Presidente Vargas.
– E?
– Explodiu tudo. Matou todos, fez o que sabia fazer de melhor. Foi o mais rápido que podia a sede e matou todo mundo. Agora ele está viajando para a Índia.
– Índia?
– Sim, vai se afastar da civilização enquanto for necessário. Até a poeira baixar, depois ele volta de novo, quando precisarmos dele.
– E quando seria?
– Quando tiverem novamente a idéia idiota de iniciarem o Apocalipse.
– Como assim?
– Entenda... Tanto as borboletas com asas quanto as sem asas desejam que isso aconteça. Cada uma das duas categorias possui um livro que diz o que cada uma ganhará e perderá quando o Apocalipse acontecer. Eles acreditam, cada uma das forças, que podem vencer as adversidades previstas. Aliás, ambas crêem na vitória de seu respectivo lado, mas...
– Mas?
– Existem seres dentro da existência que ganharam status demais para de repente uma guerra qualquer colocar tudo que conquistaram durante milhões de anos em xeque. Eu já passei por isso uma vez, não desejo ver todo o status quo de eras ser transformado em cinzas só porque duas entidades bestas decidiram chocar suas opiniões e desafetos. E assim como eu existem muitos outros que ganham muito mais com as coisas como estão do que com as coisas como serão. Inadvertidamente a guerra vai acontecer, mas, falando dos seus termos, enquanto der pra comer caviar porque optarei pela sardinha?
– Você me disse isso a respeito quando trouxeram o Devorador de volta de seu exílio.
– Sim, tentaram soltar essa besta antiga no mundo, mas impedi o pior. E esse ato vil foi praticado pelos representantes das borboletas. O ato ao qual você participou foi organizado pelo Inferno e com ajuda de algumas borboletas que também desejam a guerra. E por causa disso me aliei a um velho inimigo para juntos darmos ao planeta terra mais alguns anos de purgatório... Anos que aproveitei para me cercar do que existe de melhor no universo.
– Então quer dizer que tudo isso aconteceu por causa de Ego?
– Sim, só por causa de ego... Ego ferido de milhões de seres que se sentem na berlinda de suas próprias existências porcas. Que esperam que a filtragem que o Pai Celestial fará durante a guerra os coloque em posições melhores, criaturas mesquinhas, que sempre ficaram a margem da criação. E...
– E poder esse que outras criaturas mesquinhas não querem perder? – Interrompeu Jonas. – Da maneira como diz parece que a própria Organização ou seus caciques não queriam perder seu status e meio que se deixaram derrotar... Depois de tudo que me falou me parece que foi exatamente isso que aconteceu. A Organização se deixou derrotar.
– Não a Organização, mas um de seus líderes. Seu nome é Niamaran, deve ter ouvido falar, se não ouviu, ainda o conhecerá. Sem a ajuda dele jamais teríamos conseguido impedir isso... Bom ver que você ficou esperto esses meses que passaram... E sim, esses “mesquinhos” não querem perder. Mesmo que para isso a Terra seja sacrificada por si própria e tudo tenha que recomeçar em outro lugar.
– Quer dizer que existe como a Terra se destruir sem nenhum apocalipse acontecer?
– Sim, ou se trata a podridão ou ela consome tudo... Existem pessoas boas, más e idiotas. E os idiotas são o gado que tudo destrói... Que obedecem sem pensar... Que mesmo com todo um mundo de informações se recusam a pensar nas ordens que recebem, que nunca questionam nem a si mesmas. E se a Terra tiver que perecer imersa em seu próprio excremento moral, que seja feita a vontade dos que se interessam pela continuidade.
– Filosófico você... Albano era obcecado em obedecer ordens, isso o torna gado?
– Ele era um caso especial. Um dia irá entender porque ele usava esse chavão... Mas agora chega de falar, temos outras coisas a fazer e mais coisas a organizar. Para a próxima vez...
– Organizar? Vamos dominar o mundo?
– Sim, tal qual aquele desenho animado dos ratos de laboratório, precisamos volta a caverna e planejar...
– Se refere REALMENTE a dominar o mundo?
– Não, mas a impedir que tentem...

E os dois riem do ridículo da piada.

FIM


Revelações de Jonas, Missão: Sétima Fase da Missão


Revelações de Jonas: Missão
Sétima
Fase da Missão
Clímax



Uma névoa densa cercava Jonas. Ele via quatorze pessoas, dentre homens e mulheres envoltos por essa mesma névoa. Estavam todos parados observando para além do campo de visão de Jonas. Dentre elas conseguia reconhecer claramente as figuras de Albano e Fernando. E tal como as demais estavam completamente imóveis. A névoa diminuiu gradativamente na medida em que Jonas escutava um zumbido irritante aumentar. Procurou sem muita demora pela fonte do som e viu finalmente que cada uma das pessoas carregava consigo uma caixa com um display vermelho dando contagem regressiva.
E faltava um minuto para o contador chegar a zero.


Uma certa inquietação tomou o peito de Jonas que instintivamente tomou a caixa das mãos de Fernando e a jogou em direção ao infinito. “Pronto, está terminado.”,comemorou antes de olhar novamente para Fernando e ver que a caixa continuava no mesmo lugar. Novamente jogou a caixa distante e como da primeira vez seu retorno se repetiu. Um certo desespero começou a tomar conta de seu peito a medida que o display mais e mais se aproximava do zero. De repente as quatorze pessoas começaram a olhar para o horizonte e Jonas acompanhou-as com o olhar.

Eram os fogos de fim de ano que começavam. As pessoas se abraçaram felizes enquanto largavam as caixas no chão. Jonas escutou uma espécie de estalo e viu os contadores de todas as caixas zerarem. E de repente uma luz branca tomou conta de tudo. Ao invés de sentir a dor que esperava Jonas, apareceu novamente em Santa Tereza, no mesmo lugar onde morrera. As pessoas todas estavam trajadas de branco, sorriam. Pelo que podia ver no relógio de rua faziam cinco minutos que 2007 havia começado. Sentiu-se mais calmo e sentou-se em um dos bancos do largo dos Guimarães e escutou o bater de asas dos pássaros. 

“Pássaros? A meia noite?”, espantou-se Jonas olhando pro céu e vendo uma imensa nuvem negra se aproximar de Santa Tereza vinda do sul. Com um olhar mais apurado viu que não era uma simples nuvem, mas sim uma imensa horda de criaturas tão horripilantes quanto os Vermes do Vazio, mas aparentemente muito mais fortes. As pessoas eram incapazes de ver o que estava por acontecer. Jonas viu aquela velha senhora negra de nome Glória correndo pelas ruas pedindo ajuda pelas almas. Ela tentava em vão tocar nelas e afastá-las de algum perigo iminente.
– Assassino! A culpa é sua! – Berrou Glória, vendo Jonas.
– Minha culpa? – Questionou Jonas, sem entender o que acontecia.
– Sim, você e aquelas pessoas cheias de ódio no coração fizeram isso...
– Isso o quê?
– Isso!

Glória apontou para o lado oposto da nuvem negra e viu uma imensa horda de seres da Luz indo de encontro com os seres enegrecidos. Ambos tocaram enormes cornetas, mas um dos seres de luz se destacava. Era um anjo de vestes completamente brancas portando uma corneta de ouro que brilhava tão forte que de onde Jonas estava podia-lhe ofuscar a vista. Um dos demônios da horda oposta se destacou. Era uma criatura enorme, de forma que lembrava um canino. Ele observava as pessoas caminhando na rua alheias a toda essa tempestade que se formava nos céus. Com uma voz assombrosa, a criatura bradou.
– Ande cria de Deus! Dê a ordem! Que comecem os jogos! – Berrou a criatura.
– Que seja feita a vontade de Deus! Que o apocalipse de João se inicie!

A voz soberba do anjo ecoa por todos os lados, parecendo cruzar os mares e os oceanos, em seguida a figura imponente toca a corneta. Segundo depois um grunhido agudo é escutado e Jonas vê uma enorme figura montada em um cavalo negro passar voando rápido vindo do sul. Era uma mulher de roupas rasgadas coberta por trapos negros. Por onde ela passava uma fumaça verde dilacerava tanto pessoas quanto almas. A mulher passa por ele e um ar completamente carregado invadiu o que seriam os pulmões da alma de Jonas. Se isso acontecesse antes do treinamento, com certeza teria morrido. Mas ainda assim isso não evita a dor lacerante de sentir-se praticamente virado do avesso.

Glória, vendo a cena e a mulher se aproximar, é tomada por um desespero sem igual e corre levando consigo todas as almas que consegue carregar. Infelizmente apenas ganha alguns segundos a mais de existência, a mulher a alcança e com um simples toque nas costas faz Glória desaparecer como purpurina ao vento. Jonas permanece parado querendo assistir a tudo. As pessoas, ainda vivas, começam a cair uma a uma nitidamente sufocas por algo que Jonas não vê, mas sabe o que é. É radiação. Não muito longe, uma televisão ainda ligada anuncia que em outras seis grandes potências do mundo ocorreram tragédias iguais. Além do Eixo Rio e Sampa, os EUA, Suíça, África do Sul, Rússia, Austrália e China também tiveram ataques iguais.
 
Mas antes do repórter tenta completar a matéria, o sinal é bruscamente interrompido quando um machado de guerra coberto de sangue brilhante acerta a televisão. As hordas demoníacas estão materializadas, é o que vê Jonas. Um demônio voa em direção de Jonas e ergue enorme sua espada ameaçadora e violentamente. Não há tempo de desviar, apenas de lamentar não ter percebido a tempo. Com um arco perfeito a lâmina transpassa a cabeça de Jonas, dividindo-a em duas metades brilhantes. Jonas sente cada segundo de dor como se fossem horas. Tudo começa a ficar escuro. Completamente escuro...




Fernando desperta de seu transe poucos segundos antes de ativar o dispositivo. Graças aos efeitos das festas fim de ano toda a Usina relaxava a vigilância e associado a seu tom de pele e a noite que caíra, ficara fácil chegar até o prédio da refrigeração. Era uma enorme estrutura cônica de alumínio completamente isolada termicamente e sempre ligada, por onde enormes dutos levavam o ar gélido para dentro dos reatores em um processo de resfriamento absolutamente necessário para manter todos os dispositivos da Usina funcionando em perfeita ordem. A bomba seria instalada em um canto escuro próximo ao painel de controle do sistema de refrigeração. Se acaso encontrassem a bomba no reator, essa bomba aqui dificilmente seria encontrada a tempo.

Porém, a visão que tivera foi bem clara, e ele não podia simplesmente negá-la naquele momento. Foi como Albano dissera minutos antes, os planos da Organização iam muito além de um simples ataque terrorista. Lembrou-se de quando perguntou a Albano se iam ficar com as motocicletas e ele nem entrou no assunto. As motocicletas não seriam necessárias no mundo dos mortos. Pra sanar suas dúvidas, aciona o dispositivo e vê que tinham menos tempo do que Albano dissera, ou sabia. A bomba não explodiria quando estivessem em segurança, mas exatamente no primeiro minuto de 2007 e em diversos pontos do mundo. Nesse momento estariam perto o suficiente pra morrer.

Sem hesitar Fernando corre até a praia e arremessa o dispositivo o mais longe que pode para dentro do enorme oceano. Mesmo que exploda, o próprio oceano protegerá a Usina de seus efeitos. Mais calmo pelo que fez, Fernando respira fundo e se dá conta que terá uma missão difícil pela frente, convencer Albano a desistir. Enquanto caminha em direção ao prédio da Administração da Usina, Fernando se deixa levar por uma curiosidade quase mórbida e olha para as nuvens do céu. Sorri maliciosamente ergue seu braço direito e coloca seu dedo médio em riste, numa chacota clara a quem quer que esteja observando tudo aquilo. Se seus olhos humanos pudessem ver, teriam visto uma enorme fera rosnar de raiva pela insolência.

Enquanto isso os ecos traziam sons de tiros.



Marta estava sentada em sua mesa da recepção de Angra I. Ela se preparava para comemorar mais um final de ano naquele prédio deserto, mas dessa vez providenciara tudo para que estourasse fogos durante os fogos. Um dos seguranças da Usina, o Armando, estaria lhe esperando no segundo andar para comemorarem juntos o romper dos anos. E fariam jus ao trocadilho infame. Ela e Armando curtiam um caso desde que o enorme e másculo segurança negro de vinte e oito anos aparecera para prestar serviços pela sua firma de segurança. Marta, uma mulher bem vivida, funcionária pública, casada há vinte anos e no auge de seus quarenta anos bem conservados com muita malhação e um pouco de muito tratamento hormonal. Era um “tesão”, como diziam seus companheiros de trabalho. Ninguém desconfiava do caso dos dois, que havia começado dentro do carro de Marta logo no primeiro dia de trabalho de Armando, na garagem da Usina.

De repente seus afazeres extremamente importantes envolvendo maquiagem foram interrompidos pelo súbito som de pancadas do lado de fora do prédio. Pareciam estampidos de fogos contidos por alguma coisa. Marta estranhou e passou um rádio para a equipe de segurança externa. Não obteve resposta. Um calafrio percorreu sua espinha e ela imediatamente pegou o telefone para chamar pela polícia. Completamente mudo. Mais apavorada ainda tentou pegar seu celular apenas pra sentir-se pior ao constatar que o bloqueio de sinal funcionava perfeitamente bem. Estava completamente isolada de tudo.
De repente um dos seguranças externos invadiu o prédio dando disparos a esmo para o lado de fora. Marta jogou-se desesperada no chão, colocou a mão sobre a cabeça. Escutou mais tiros, gritos do segurança, e de repente um baque forte contra sua mesa. E mais nada, apenas um silêncio profundo. Não ousou se mexer, mas então sentiu um líquido pingar em sua nuca e escorrer por seu pescoço e entre os cabelos até chegar a sua boca. Instintivamente tenta ver o que é, mas antes que possa perceber ou confirmar do que se trata, uma mão a agarra pelos cabelos e a ergue violentamente de seu esconderijo até um enorme homem loiro de olhar cruel.
– Por favor... Não me mata! – Implora Marta, com o corpo todo banhado do sangue do segurança, que jaz morto no balcão.

Tirolez olha a mulher nos olhos e diz “Ula Ta'lan L’nis’yuna.”, em seguida aponta sua FiveSeven munida de silenciador na cabeça de Marta. Uma lágrima escorre de seu rosto quando de repente ela escuta um tiro e um zumbido passa próximo dela. Tirolez se esquiva quase que instintivamente, mas deixa os cabelos da mulher escaparem de sua mão. Com uma procurada rápida com o olhar vê um enorme segurança negro apontando uma arma para ele. “Esse negro é bom...”, pensa Tirolez, dando conta que o tiro passou raspando pela proteção do ombro de seu sobretudo. Se fosse mais para a esquerda estaria morto.
– Largue a arma e erga as mãos. – Disse Armando, enquanto Marta corria até ele toda banhada do sangue de seu parceiro.
– Com prazer. – Responde Albano.

O assassino solta a arma com certa violência contra o chão e de modo tal que assim que cai dispara aleatoriamente e diversas vezes, e ao mesmo tempo se joga na direção do balcão. Armando leva um susto e se coloca diante de Marta, para protegê-la de eventuais disparos. Esses milésimos de segundo dão tempo suficiente a Tirolez de sacar uma granada de fragmentação e a arremessar contra o casal enquanto salta para trás do balcão que agora serviria de trincheira. Pra aumentar a proteção puxa o corpo do segurança morto e cobre-se com ele, levando um banho de sangue.

Armando não pensa duas vezes quando vê a granada e só pensa na segurança de Marta. Ela tem uma família, e ele? Apenas é um enorme consolo que as mulheres utilizam pra satisfazer fantasias. E no fundo, ele realmente ama Marta e quer salvá-la de qualquer jeito. Por isso, sem hesitar salta sobre a granada e a cobre com seu corpo. Marta tenta algo, mas apenas escuta o som abafado da explosão destruindo Armando e o corpo de seu amante sacudindo por causa do impacto contido. “Corre”, diz Armando um segundo antes de tocar o chão. 

Marta hesita por um instante querendo abraçá-lo e beijá-lo uma última vez, mas precisa correr como nunca. Deixa seus sapatos de salto alto para trás e corre em direção a saída, mas antes de passar pela porta é atingida por algo nas pernas e rola pelo chão. Ainda grogue vê uma cadeira da recepção ao seu lado, coberta de sangue, e sente uma dor enorme na canela direita. Ao olhar para a perna vê o osso exposto, fraturado pela violenta pancada. O louco arremessara a cadeira da recepção contra ela e agora caminhava friamente em sua direção.

“Amem!”, fala Albano, sacando sua segunda pistola e disparando contra o rosto de Marta, que tomba no chão, ainda viva. Obviamente Albano percebe, mas pra não desperdiçar mais balas, ele ergue a cadeira que arremessou segundos atrás e golpeia Marta diversas vezes até que de sua cabeça apenas restem fragmentos dos ossos do crânio espalhados pelo chão cobertos de sangue. Satisfeito com o resultado, joga o que sobrou da cadeira sobre o cadáver e vai até o elevador da Administração. Falta muito pouco para concluir a missão, e quando estiver na porta da área restrita ele e Fernando cumprem a missão e partem o mais rápido que podem. Apesar de não estar incluída nas ordens sua sobrevivência, Albano não deseja morrer ali. “Morte é a falha da missão do soldado.”, pensa.
No caminho Albano ainda mata mais dois seguranças e vai para o local de encontro.



Ele aguarda solenemente o momento em que deve aparecer. Está sentado em uma cadeira na ante-sala do objetivo de todos. Ajeita seu terno impecável e penteia seus longos cabelos loiros. Precisa estar perfeito para o grande momento. São nove horas da noite, ainda faltam três horas para tudo acontecer. E vai acontecer. O insolente pode ter feito o que fez, mas ainda restava um dispositivo. Malditos anjos caídos, sabia que não podia confiar neles jamais, mas as circunstâncias tornaram isso obrigatório. Naquele momento era a única maneira. E tudo isso por causa daquela zombeteira que atrasou o plano dos planos.



Fernando chega correndo ao saguão de entrada precisamente as nove e meia da noite. Demorou a chegar porque no caminho teve que espantar dois drogados que vieram assistir o tiroteio. Por sorte não precisou matar os dois, mas evitaria falar disso a Albano porque ele odiava testemunhas. Por sinal, o rastro de Albano era nem um pouco delicado. Até chegar a entrada viu pelo menos dez seguranças mortos, e quando coloca os pés no interior do prédio principal a primeira coisa que vê é uma mulher de aparentemente quarenta anos com a cabeça esmigalhada e espalhada pelo chão. 

Não muito longe desse cadáver vê um outro segurança deitado no chão com uma poça de sangue debaixo dele. O cheiro recente de queimado e alguns fragmentos de granada dão a Fernando a noção exata do que ocorrera e desiste de virar o corpo pra ver o que acontecera. No final do saguão vê um corpo jogado no chão e um rastro de sangue leva até um dos elevadores. É fácil para Fernando saber para qual andar Albano foi, o botão do subsolo está marcado de sangue. Por um instante Fernando mostra-se preocupado com a quantidade de sangue.

Nove e quarenta da noite ele finalmente encontra Albano sentado diante da porta de acesso aos níveis restritos. Sua cadeira é formada por dois corpos dos seguranças amontoados um sobre o outro, formando uma espécie de cadeira mórbida. Seu parceiro está completamente coberto de sangue, mas aparentemente inteiro. E pra variar, está fumando apesar dos avisos do perigo de se fumar naquele ambiente. “Pra que se importar com avisos, se isso vai explodir mesmo?”, fala Albano notando o espanto de Fernando. O jovem negro pensa em avisar a Albano do perigo que correm naquele momento, mas é melhor fazer isso quando virem o timer se ativar. “Talvez o susto da proximidade da morte o torne mais sensato e menos obcecado.”, pensa Fernando, com muita esperança disso.
– Você chegou vinte minutos mais cedo. – Comentou Albano. – Nem comecei direito a fumar meu primeiro cigarro... Vamos logo, fez tudo direito?
– Sim. – Mentiu Fernando, descaradamente. – Estava pensando, quantos meses passamos juntos?
– Acho que quase seis meses, meio ano. – Disse Albano.
– Gostaria de dizer que foi muito bom ter você como amigo.
– Já vai começar com seus trejeitos? – Comentou Albano, rindo. – Te mato aqui mesmo...
– Bem, tem algo que quero lhe dar, pois estou com um pressentimento ruim. – Disse Fernando, sentindo-se estranhamente confuso.
– O que?

Fernando salta sobre Albano e o beija apaixonado. Inicialmente, e provavelmente completamente chocado, Albano fica estático por muito segundos que nem uma estátua. De repente se dá conta do que está acontecendo e joga Fernando contra a parede. A primeira coisa que faz é puxar sua faca de caça e imprensá-la contra o pescoço de Fernando, quase degolando-o. Entretanto, pela primeira vez em sua carreira toda ele hesita. Não vai matá-lo naquele momento, apesar de Fernando ser completamente descartável, ainda mais depois dessa ousadia, ele surpreendentemente não quer vê-lo morto.
– Nunca mais faça isso. – Diz Albano, com o olhar cheio de ódio e ao mesmo tempo completamente chocado por dentro.

Albano limpa sua boca com o sangue espalhado em suas roupas e pega um dos cartões de identificação dos soldados mortos. Digita a senha que obteve enquanto mentia dizendo que pouparia a vida deles se a fornecessem, e depois passa pela identificação de retina arrancando o olho de um deles. Um apito rápido e uma luz verde se acendem, dando aos dois a autorização necessária para avançar. Uma névoa branca e muito fria se espalha pelo corredor, cobrindo ambos até um metro de altura. Nesse momento ambos agradecem por terem lembrado de colocar sobretudo.

O assassino, munido de seu revólver, é o primeiro a entrar, seguido de Fernando. É uma sala branca, ampla, cheia de macacões brancos revestidos com chumbo. Um pouco mais a frente existe uma porta de vidro reforçada que dá em um outro ambiente que de lá podem ver que tem diversos chuveiros. Imediatamente os dois percebem que estão nas câmaras de descontaminação. Para evitarem problemas, ambos começam a se vestir adequadamente para o que têm que fazer juntos. E avançam para a sala seguinte.



Os ímpios estão vestindo as roupas de proteção. O primeiro verme a entrar na sala de desintoxicação é o loiro oxigenado. Não gosto dele, ele fede a sangue e veste-se com o sangue dos inocentes. Mas ele é necessário. O insolente o segue como o pecador que é. Não importa, eu vou deixá-los darem passos largos em direção de minha humilde presença. Não quero que me percebam até que a porta esteja trancada. Providenciei névoa fria o suficiente para ocultar-me deles até julgar necessário. Eles precisam estar desse lado em que estou. Se quisesse os puniria de imediato, mas apenas Ele pode fazê-Lo e autorizar-me, mas darei a Ele a chance de escolha.



Fernando e Albano caminham pelos chuveiros paramentados completamente para adentrarem no coração da Usina, o reator. Albano carrega consigo o dispositivo explosivo enquanto Fernando estuda formas de convencer Albano a desistir da missão. “Como convencer um homem a parar... Ainda mais um homem que usa corpos como cadeira?”, indaga Fernando perdido em pensamentos. Sempre de arma em punho, os dois evitam caminhar rapidamente e serem surpreendidos por algo desagradável saindo dessa névoa, que obviamente não é normal nesse ambiente. Está frio até demais para os padrões informados nos planos que estudaram nos últimos meses. Com cautela passam para a sala seguinte, faltando apenas mais uma para chegarem finalmente ao reator principal.
– Tome cuidado. – Falou Albano. – Não sabemos o que nos espera aq...

Albano não consegue completar sua frase, uma força misteriosa o ergue no ar e o choca violentamente contra a parede. A arma de Albano é jogada do outro lado da sala e quando pára todas as balas da mesma se espalham pela sala saltando uma a uma do tambor do revólver. A caixa com os explosivos cai do mesmo jeito, desaparecendo na nevoa. Fernando até tenta fazer algo, mas a mesma força age sobre ele e o joga contra a parede diversas vezes. As pancadas são tão fortes que a roupa que usa se rasga, expondo-o a radiação. Uma dor terrível imediatamente percorre o corpo de Fernando, muito mais motivada pelo psicológico do que pela radiação em si, que é mínima. Os dois presos na parede por essa força misteriosa procuram pela origem do problema e vêem uma pessoa se aproximando vinda da sala seguinte.

É uma mulher de aparentemente vinte e poucos anos. Cabelos loiros e cacheados, olhos azuis e um semblante pacífico. Usa um batom levemente avermelhado e seu rosto está levemente corado. Veste um terno branco igual aos dos malandros da lapa, que deixa suas belas curvas ainda mais sensuais, com uma rosa vermelha na lapela. Sua mão direita segura o tradicional chapéu de palha, completando o visual. Fernando e até mesmo Albano ficam hipnotizados pela beleza pura e profunda da mulher de vestes pouco usuais. Mas algo na moça faz com que ambos sintam-se um tanto perturbados por sua presença.
– Ímpios... – Balbucia a mulher de voz doce e serena, sem aparentar nenhuma raiva. – Vieram até aqui para falhar?
– Falhar? – Estranhou Albano. – Como assim falhar?
– Exato, Albano. – Disse a mulher. – Existe uma mácula em seu plano.
– Se você sabe meu nome, acredito que mereça ao menos saber o seu...
– Sônia,... Ou arcanjo Bismaah, 15º das tropas de São Rafael... Só não sei que diferença faz saber meu nome...
– Faz, ao menos tenho o que colocar na lápide.
– Na situação em que se encontra, acreditas realmente que vai conseguir algo além de quicar na parede até eu me cansar?

As palavras da mulher foram enfáticas e num piscar de olhos Albano quicou na parede diversas vezes. O som dos ossos de Albano estalando e sendo quase quebrados era escutado por todos na sala. E apesar de todos esses atos, o olhar de Sônia não mudava, ela continuava calma e serena. Fernando em paralelo se indagava em como ajudar seu parceiro a sair dessa situação, mas não conseguia pensar em nada.
– Satisfeito? – Afirmou Sônia, jogando o corpo dolorido de Albano no chão. – Agora pode me ouvir ou continuo de onde parei?
– Fale... – Balbuciou Albano. – Nada que disser vai me convencer a não te matar.
– E quanto a matar o negro ao seu lado?
– Ele?
– Sim, acredito que esse PC de bolso que carrega seja capaz de ver um vídeo interessante filmado pelas câmeras de segurança... Não?
– E onde está esse vídeo?
– Aqui.

Sônia sacou do bolso um pequeno cartão de expansão de memória. Foi calmamente até Albano e o encaixou no PDA que seria utilizado para sincronizar os explosivos. Albano nada podia fazer a não ser assistir, pois estava completamente imóvel. Subitamente Fernando sentiu um calafrio ao ver o PDA ser ativado por Sônia e abrir o programa de executar arquivos de mídia. Propositalmente Sônia se colocou na frente de Fernando, impedindo-o de assistir ao vídeo. Fernando viu nitidamente o semblante de Albano mudar e seu olhar assassino assumir o comando novamente. Um novo calafrio percorreu sua espinha.


Sem demonstrar nenhuma emoção, Sônia se levantou e foi até a arma de Albano. Analisou-a, abriu o tambor vazio e uma a uma as balas que estavam espalhadas pelo chão voam e voltam para o lugar onde tinham saído. Albano e Fernando permaneceram calados o tempo todo, vendo a arma ser colocada de volta em atividade. Quando a última bala encaixa no tambor, Sônia deposita o revólver no chão e o chuta até Albano. Imediatamente o assassino se vê livre novamente e pega sua arma. Fernando se esforça pra se mexer, pressentindo que algo está errado, mas a única coisa que consegue é rasgar o que resta de suas roupas sendo novamente chocado diversas vezes contra a parede.
– Quer ver o vídeo, meu amigo? – Fala Albano, olhando fundo nos olhos de Fernando.
– Do que está falando que tem no vídeo? – Pergunta Fernando, nervoso, mas sem entender o teor do vídeo.
– Este vídeo...

Albano pega o PDA e mostra o vídeo a Fernando. É uma gravação do sistema de segurança, mostrando exatamente o momento em que Fernando ergue o dispositivo em frente o cais e o arremessa no mar. Os olhos de Fernando não acreditam no que vêem e passa a ter a certeza de que tudo está perdido.
– Em uma guerra, sabe o que acontece com os soldados que traem a tropa?
– Albano, deixe-me explicar... Nós vamos morrer! Fomos traídos e sacrificados pela Organização! A bomba está programada pra nos levar junto! Espere!...

Fernando não consegue completar a explicação. Albano dá seis tiros no peito dele, que tomba no chão já morto. Sônia finalmente sorri quando vê o corpo morto de Fernando no chão e comemora internamente. Ela vê no braço de Fernando a marca daquele que mais odeia, a assinatura da Sombra. Dessa vez a maldita Sombra não conseguiu adiar o inevitável. Dessa vez, ela foi derrotada. Dessa vez tudo vai acontecer do jeito que querem, mesmo que para isso tenham que ter ajudado os malditos anjos caídos. Albano abaixa a arma e algo em seu semblante parece mudar, mas que Sônia, imersa no próprio orgulho, não percebe.
– Parabéns soldado. – Falou Sônia, trazendo consigo o dispositivo explosivo e o entregando nas mãos de Albano. – Agora, a próxima sala é seu destino. Os técnicos lá dentro estão mortos... Seus corações pararam, sabe?
– Diga-me uma coisa, porque vocês fizeram isso? – Pergunta Albano, enquanto confere seu revólver.
– Porque há anos vemos a humanidade se degradar, se destruir uns aos outros... E nada podemos fazer a não ser pescar entre os ímpios poucos dignos de escapar da entropia humana. Se não fosse o Pacto das Águas, já teríamos dizimado sua civilização e eliminado esse câncer que tanto alimenta as hordas infernais... Tudo por causa do Livre Arbítrio.
– Estranho, não deveriam proteger a humanidade? Não foi esse o motivo da queda de tantos de vocês? Discordar disso?
– E é o que faremos... Protegeremos a humanidade dela mesma. Uma nova era, sob o nosso julgo, pois ganharemos dos cães do Inferno na guerra que eles querem começar. Assim está escrito.
– E todos os seus são partidários disso?
– Nem todos... Existem alguns que ainda acreditam na raça humana, cegos por um amor que não deveria existir.
– No final das contas vocês são bem parecidos com os sem asa...
– Encare como quiser, soldado... Faça o que sabe fazer de melhor, cumprir ordens.

Albano ergue-se a caminha calmamente em direção a próxima porta. Sônia sorri discretamente, satisfeita por ter dado a vitória aos inferiores a ela. Sabe que cometeu pecados, mas Ele perdoará todos os seus irmãos que participaram disso. Ele perdoará quando assistir os frutos de seus atos. Todos os seus irmãos alados avessos a essa visão os perdoarão por isso, todos. E agora falta tão pouco para a primeira trombeta soar, que Sônia se deixa escutar ao longe o bater das asas das tropas ávidas pelo combate. E então escuta um som nada convidativo, o de uma arma sendo engatilhada.

O assassino aproveita-se da distração da mulher e gira o corpo disparando os dois últimos tiros de seu revólver. As balas atravessam o peito de Sônia, que cai no chão completamente desconcentrada, e incapaz de manifestar seus poderes por causa da dor intensa no peito. “Malditas carcaças...”, lamenta Sônia por estar presa a carne e suas dores. Ainda caída no chão ela gira seu corpo e olha Albano nos olhos, ergue sua mão direita para invocar suas últimas forças. Albano saca sua faca de caça e decepa a mão de Sônia antes que possa fazer seu truque novamente. Sônia grita de dor e segura o coto de sua mão que solta muito sangue.
– Tem uma coisa que eu quero que você leve contigo para seus semelhantes... – Diz Albano.
– O que? – Pergunta S6onia, antevendo seu destino.
– Isso!

Tirolez rasga a roupa de proteção e seu sobretudo com a faca. Expondo exatamente a mesma marca que há no corpo do recém-falecido Fernando. A marca da Sombra. Sônia observa estupefata a revelação de Albano e é tomada por uma fúria tamanha que seus poderes voltam a funcionar. Ela produz um vento misturado a chamas divinas, e joga Albano novamente contra a parede. O ataque é tão violento que pedaços do chão são carregados pela ventania, atingindo Albano diversas vezes como se fossem navalhas. Albano não demonstra sofrer, e apenas exibe um sorriso malicioso nos lábios, deixando bem clara sua mensagem. Os olhos de Sônia já estão pesados por causa da perda de sangue, mas ela está completamente disposta a levar Tirolez com ela.
– Sabe o que mais gosto nesse país? – Berra Albano, sentindo a pressão de ar querendo tomar-lhe a consciência.
– O que? – Berra Sônia, querendo prolongar o sofrimento de Albano.
– A eficácia de nosso serviço público.

Sônia é atingida em cheio por um pedaço de reboco que solta do teto. Como seu próprio vento era violento por demais, o reboco joga a mulher contra Albano que a pega num abraço mortal. Sônia sente quando Albano encrava-lhe a faca na barriga e a gira. “Nos vemos no inferno.”, diz Albano, e sem tirar a faca do corpo de Sônia faz um arco para cima abrindo um enorme corte na mulher que começa em sua barriga e vai até seu ombro direito. Já sem nenhum esboço de vida Sônia cai no chão e toda a violência de seus ataques cessa. Albano, livre de tudo, pega novamente a caixa explosiva e caminha cambaleante em direção ao reator. Ele vê a hora, ainda são dez horas da noite, ainda há tempo de cumprir sua missão.
– Um soldado sempre cumpre sua missão.



Em todo o mundo a rede da Organização entra em colapso. Não há resposta alguma dos dispositivos que deveriam ter sido instalados na Usina de Angra I. Regina recebe diversas ligações.de outros líderes, querendo respostas sobre a falha do núcleo do Rio de Janeiro. E falha significa morte na Organização. Ela tenta diversas vezes ligar para o celular de Albano e de Fernando, mas a única coisa que escuta é a mensagem da operadora avisando que os celulares estão fora da área de cobertura. Faltam apenas um minuto para a meia-noite e nada de obter resposta.


Regina naquele momento está dentro da sede da Organização, preparando seu helicóptero para fugir dos detritos nucleares que chegarão depois da explosão. Mas a falta de informações a respeito de seus assassinos a preocupa. Os satélites informavam que nada ocorrera, então não tinham morrido por causa de nenhuma explosão, e Albano era bom demais para falhar desse jeito. Já escutava de longe o eco dos fogos sendo disparados pelo Rio de Janeiro. As luzes de 2007 estavam à espreita e nada tinha acontecido. Faltavam menos de um minuto para explosão.


De repente Regina escuta o som de tiros, muitos tiros. E gritos. Ela rapidamente chama pela segurança pessoal e se lembra que enviou seu soldado principal para a morte. Por ordens do maldito Niamaran. Ela nunca sacrificaria seu melhor soldado e amante, nunca. O som de tiros cessa e alguém gira a maçaneta da sala de Regina. Ela sente a morte próxima, mas quem vê entrar na sala é Albano.


Suas roupas estão em frangalhos. Ele está coberto de sangue e seus olhos estão tomados por sua fúria assassina. Regina, ignorando o perigo corre até ele e o abraça. É um abraço sincero, ela realmente gosta dele. Abados se importa com Albano. A retribuição vem na forma de um chute violento na barriga que a joga contra a mesa. Regina tenta se levantar, mas não consegue. Dói muito e várias costelas quebraram com a pancada.
– Albano? O que aconteceu? – Pergunta Regina, assustada.

Tirolez não responde e apenas mostra a ela o dispositivo explosivo restante. Ele aperta o botão azul do dispositivo e o display mostra que restam apenas três minutos. Regina desespera-se mais ainda, e se esforça em se levantar para correr. Albano saca sua pistola e atira nos joelhos de Regina, que cai no chão gritando de dor e chorando. “Eu te amava maldito... Eu te amava! Eu nunca quis te enviar para lá! Nunca!”, berra Regina, sofrendo mais pela traição súbita dos sentimentos de Albano do que pela dor física. Sem olhar para trás Albano abandona o dispositivo e parte, deixando apenas o dispositivo.
Regina se arrasta em vão pelos corredores da Organização tentando fugir.


É zero hora e três minutos do primeiro dia do ano que se inicia, 2007...


Os fogos tomam conta de Copacabana. É um espetáculo maravilhoso de luz e sombras. Como nos anos anteriores o investimento no espetáculo provoca maravilhas nas pessoas. De repente uma enorme explosão é escutada por todos e um clarão vem do centro da Cidade. Todos imaginam se tratar de parte da comemoração e aplaudem felizes pelo início de um novo ano. No centro da cidade os últimos andares do prédio 1056 da Avenida Presidente Vargas estão em chamas. Os bombeiros, ainda entorpecidos pelas comemorações demoram pelo menos cinco minutos para chegar e vêm um espetáculo de chamas e horror que muitos carregarão para sempre com eles. A explosão foi tamanha que havia chamas em pelo menos quatro prédios vizinhos, e até mesmo a pista central da Av. Presidente Vargas estava coberta de destroços. Se existia algum ser vivo naquele lugar, não teria o que se enterrar.



Em um desfiladeiro vermelho, em algum lugar muito distante, duas taças de champagne chocam-se uma com a outra. São seres satisfeitos e felizes com o resultado de tudo. Bebem com louvor do líquido e tornam a encher os copos. Há muito que comemorar naquele início de ano. No último gole arremessam a garrafa e as taças na imensidão do Rio Cinzento.
– Eu falei que conseguiria... – Diz a Sombra.
– É, eu sabia, nunca duvidei de você. – Respondeu o outro ser, envolto por um manto cinza claro.
– E agora o que faremos?
– Curtir nossa vitória...

E os dois seres gargalharam...

Revelações de Jonas, Missão: Sexta Fase da Missão

Revelações de Jonas: Missão
Sexta Fase da Missão
Execução

Os corpos foram queimados nos minutos que se seguiram. Tirolez jamais perderia essa oportunidade, por mais que doesse sua perna em virtude do tiro que levara. Ainda tinha disposição suficiente para correr uma maratona se precisasse ou se ordenassem. Providenciou durante a queima que a Carne Moída ficasse em uma posição de destaque e deu-lhe um banho especial de gasolina para queimar melhor e por mais tempo.

Enquanto isso uma equipe da Organização providenciou uma substituição do carro queimado de Albano por um de seus outros dez carros. Como estavam próximos de uma das bases operacionais, a Ilha do Fundão, a substituição ocorreu em menos de dez minutos dando aos dois agentes tempo o suficiente para seguirem viagem rumo ao aeroporto ainda a tempo de acompanharem Amanda para Angra dos Reis. Fernando permaneceu o tempo todo calado, voltando a falar apenas quando entraram novamente no novo carro.
– Como você conseguiu sobreviver? - Perguntou Fernando, depois de muito tempo sem falar.
– Sorte e um pouco de habilidade. – Respondeu Albano.
– Habilidade? – Perguntou Jonas.
– Sim, treinei rolamento por muitos anos e fiz cursos de dublê de filmes de ação em Hollywood, com isso aprendi que tipo de roupa vestir e como preencher minhas roupas com química de escola.
– Roupas? Química de escola?
– Você realmente acha que eu vestiria um sobretudo num calor tropical só por causa de visual?
– Bem...
– Não, ele é preenchido com uma camada protetora que agüenta alguns tiros, e na camada superficial tem bolsas de plástico recheadas com sangue do diabo... Está vendo sangue em mim além do da perna?
– Não.
– É disso que eu falei... Sangue do Diabo é uma substância que se fazia em casa nos meus tempos de escola. Misturamos Lactopurga com amônia e temos um sangue falso muito convincente, mas que some depois de alguns minutos.
– Estranho...
– O que?
– Quem te vê com toda essa calma nem imagina que minutos atrás você estava queimando um monte de gente...
– É porque matei... Como te disse mais cedo, eu sou viciado em matar, e quando mato fico calmo demais.

Fernando se calou novamente. Já tinha visto e ouvido demais para aquela noite, e só queria terminar aquele serviço o mais rápido que pudesse. Primeiro uma qualquer que se achava a rainha da cocada preta, depois um tiroteio. "Preciso dormir logo", pensava Fernando quase dando cabeçadas na janela do carro.



Amanda aguardava impaciente pelo retorno dos agentes. Sua vontade era ter pego o jatinho assim que chegaram ao aeroporto. Mas não! Ela era obrigada a esperar por ordens expressas de Regina. Ao final de uma hora entediante os dois chegaram. Albano mancava e estava com uma das pernas coberta de sangue. O negro parecia estar bem. Amanda queria que o negro tivesse morrido. Ela odiava essa raça, e depois de iniciada continuava a odiar ainda mais.
– Saudades... – suspirou Amanda, diante dos outros agentes que a acompanhavam.
– Do que? – Perguntou o agente, estranhando a súbita mudança no tom de voz sempre arrogante de Amanda.
– De meu outro eu... Se fosse naqueles tempos não me sentiria suja. – Respondeu Amanda.
– O que você era antes? – Continuou o agente.
– Ku Klux Klan. – Afirmou Amanda, olhando com orgulho enquanto notava que Fernando escutara tal nome.

Fernando bem pensou em responder Amanda a altura, mas foi contido por um puxão de Albano em sua camisa, fingindo pedir auxílio para andar. “Não... Deixe o dela pra depois... Primeiro as ordens! Sempre as ordens!”, sussurrou Albano no ouvido de Fernando. O jovem negro precisou realmente se controlar para ao menos não dar um sonoro bofetão naquela mulher irritante, mas pelo olhar de Albano sabia que nada de bom viria. E pra evitar problemas passou o restante do tempo cantarolando músicas em sua mente pra escapar das provocações que escutaria durante a viagem.



Mesmo com todos os atrasos, os quatro agentes da Organização e Amanda ainda conseguiram chegar até o pequeno aeroporto de Angra por volta das quatro da manhã. Para evitar complicações nos ferimentos de Albano, o assassino foi direto para um hospital particular financiado pela Organização para tratar da perna. Fernando permaneceu na pousada onde se hospedaram o restante da madrugada e até o horário em que Albano retornou. Nitidamente aborrecido porque os médicos queriam que ficasse em repouso, mas Albano somente o faria após cumprir suas obrigações. Por volta das cinco horas da tarde do dia seguinte o telefone celular de Albano tocou. Ele e Fernando já estavam num táxi a caminho do aeroporto quando Regina fez sua ligação revoltada:
– O que diabos vocês estão indo fazer no aeroporto a essa hora?
– Bem, você disse para não sairmos de Angra... Ia te ligar do Aeroporto. – Respondeu Albano, relativamente ríspido.
– Pois então voltem para a pousada. Amanda irá encontrá-los dentro de meia hora. – Ordenou Regina, desligando o telefone em seguida.
– Droga. – Reclamou Albano, enquanto colocava o telefone no bolso.
– O que foi? – Perguntou Fernando, não gostando do tom de voz de Albano.
– Temos que voltar, aquela filha da puta da Amanda tem ordens da Regina para nós!
– Merda!

Imediatamente Albano ordenou ao taxista que os levasse de volta a pousada e em menos de vinte minutos estavam novamente no saguão do local. Amanda estava sentada no bar do hotel, bebendo um whisky e tragando um charuto provavelmente de Havana. Como sempre, ela estava acompanhada de seus seguranças, pelo menos oito seguranças dessa vez. Era estranho ver uma mulher com tal fisionomia tragando um charuto com tamanha facilidade, mas era exatamente isso que ocorria. E o charuto fedia tanto que o gerente do hotel sentia-se incomodado, mas por ela ser quem era deixava passar direto e fingia ignorar.

Os dois agentes da Organização sentaram-se diante de Amanda, puxando um banco de madeira cada. Albano puxou um cigarro e começou a fumar, fazendo questão de soltar à fumaça em cima de Amanda. Fernando pensou em sorrir com isso, mas pra evitar maiores discussões optou por ficar calado enquanto pudesse.
– E então? Diz logo... – Falou Albano, deixando transparecer sua irritação.
– E perder a chance de saborear o momento? – Respondeu Amanda, dando uma longa tragada no charuto e retribuindo o banho de fumaça de Albano. – Falo quando quiser, o interesse é de vocês... Se quiser espero o dia todo só pelo prazer de tê-los submissos ao meu lado.
– Devo lembrá-la que posso ligar para Regina a qualquer momento? – Disse Albano, com um sorriso no rosto e pegando o celular em seu bolso e começando a ligar. – Se por acaso suas atitudes prejudicarem a Organização, estou autorizado a... Você deve lembrar, não?

Amanda gelou e parou de fumar. Acenou aos seguranças que foram direto até o gerente e pediram a chave de um quarto. De chave entregue, um dos seguranças vai em direção aos quartos e os sete restantes foram Os três – Albano, Fernando e Amanda. – se levantaram e caminharam até esse quarto, acompanhados de perto pelos seguranças da mulher. No que chegaram, foram recepcionados pelo segurança que saiu na frente. Para entrar no quarto dois seguranças acompanharam Amanda e os cinco restantes ficaram no corredor em frente a porta do quarto. 

Não que não quisessem entrar, mas o quarto era pequeno para tanta gente. Dentro do quarto ficaram então três dos seguranças de Amanda, a própria, Fernando e Albano. Era um quarto típico da região. Apenas um armário simples, uma cama de casal e a porta do banheiro da suíte. Ao menos tinha uma enorme janela que dava para ver a Praia do Retiro. Amanda sentou-se na enorme cama e tornou a acender o charuto, ordenando aos seguranças que trouxessem a encomenda. Imediatamente um dos seguranças que ficou do lado de fora foi correndo em direção ao carro dela.
– Deve demorar uns cinco minutos... Podemos conversar enquanto isso... – Balbuciou Amanda, sem retirar o charuto da boca. – Você, crioulo, como conseguiu entrar na organização? Ouvir dizer que é biba... Como consegue não agarrar esse deus romano ao seu lado?
– ...
– É preta e muda? – Disse Amanda, continuando a provocar. – Deve ser o sotaque de Paraíba dele que te irrita, não? Eu também odeio essas merdas... Pretas, paraíbas... Essas porras tinham todas que morrer! Mas eu? Sou uma mulher perfeita! Tenho o dinheiro de meu marido pra me sustentar e um monte de político querendo meu rabo... Vou ficar cheia da grana em pouco tempo! E vocês? Vão encher o rabo de chumbo mais cedo ou mais tarde... Pelo menos a pretinha vai curtir.

Fernando fez menção de avançar e quebrar a cara de Amanda, mas ela foi salva pela chegada repentina do segurança que fôra até o carro. O rapaz trazia consigo uma pasta preta grande, no formato A2 e a colocou sobre a cama. Amanda a abriu e retirou dela algumas plantas avulsas. Fernando e Albano observaram os papéis com interesse e leram em diversos que se tratavam de material da EletroNuclear, a agência nuclear do Brasil. Eram todas as plantas da Usina Nuclear de Angra I. Sem entender do que se tratava, Albano e Fernando analisaram o material sem compreender a magnitude de tudo aquilo, até que Amanda recomeçou a falar:
– Bem, seus cérebros atrofiados não devem estar compreendendo... Essa é a missão de vocês.
– Missão? – Perguntou Albano, sem levar Amanda a sério.
– Sim, no dia 31 de dezembro desse ano, quando derem onze horas e cinqüenta e nove minutos, vocês deverão explodir todo o complexo nuclear de Angra I.
– Entendo. – Respondeu Albano, sem demonstrar muita preocupação.
– Dentro em breve as pessoas da organização entrarão em contato com os detalhes da missão, até lá serão felizes habitantes de Angra dos Reis.
– Essa era sua participação na missão? – Perguntou Albano.
– Sim, porque a pergunta? – Respondeu Amanda. – Eu deveria trazer e obter os planos e mapas de Angra I para vocês, depois estaria livre pra curtir a vida.
– Ótimo.

Angra I, um belo lugar, não? 
 
Antes que Albano pudesse fazer o que queria, Fernando sacou sua arma FiveSeven e disparou duas vezes acertando o peito de Amanda, que voou pela cama em direção a parede do quarto. Os seguranças tentaram ensaiar algum movimento, mas foram mortos por Tirolez que foi mais rápido e deu um tiro certeiro no joelho de cada um. Os dois assassinos rapidamente trocaram olhares e Fernando caminhou até Amanda, que estava caída no chão chorando cheia de dor.
– Dói, não? – Perguntou Fernando, enquanto recarregava a arma e se aproximava mais.
– Preto desgraçado... Preto desgraçado... – Falava Amanda, com as mãos no peito.
– Sabe, até te conhecer eu pensava duas vezes antes de matar alguém... – Continuou Fernando, até se aproximar de Amanda e poder sussurrar em seu ouvido. – O legal é que vou te destruir em definitivo, vês a sombra? Diz a ela que a “preta biba” te aguarda...

Os olhos de Amanda viram algo que não tinha percebido antes e ela tentou gritar por ajuda, mas era tarde demais. Fernando descarregou a arma na cabeça de Amanda, que no final dos disparos era apenas um enorme cadáver decapitado coberto de sangue e restos de crânio. Tirolez se aproximou de Fernando e colocou-lhe a mão direita sobre o ombro de Fernando. “Matar é viciante...”, disse Tirolez enquanto dava um último disparo sobre Amanda, cujo corpo ainda apresentava espasmos involuntários. Os seguranças foram poupados, não por piedade, mas porque eram membros da Organização, e conseguiram avisar Albano a tempo. Se tivessem demorado, com certeza teriam sido todos mortos. Minutos depois do assassinato, enquanto o corpo de Amanda estava sendo levado para o esquecimento, o telefone de Albano tocou, era Regina novamente:
– Você não consegue deixar de matar, não? – Perguntou Regina, com a voz carregada de ironia.
– Dessa vez não deu tempo... O calouro foi mais rápido que eu, quando vi já tinha dado dois tiros na vagabunda. – Respondeu Albano, fazendo questão que Fernando escutasse. – Qual a missão exatamente?
– Bem, vocês dois vão passar o restante do ano aí observando os hábitos de Angra dos Reis para na ultima noite do ano instalar um dispositivo que vai destruir a usina nuclear de Angra I.
– Posso saber o motivo?
– Não, apenas cumpra as ordens... Mas não se preocupe, o dispositivo tem um timer e ele vai explodir três horas depois que tiver partido, logo, terão tempo pra fugirem.
– Não me importo em fugir, apenas em cumprir a missão... A qualquer custo.


Os meses se passaram. De Maio a Junho de 2006 era tempo o suficiente para que conseguissem mapear toda a cidade e criar rotas de fugas que lhes permitissem fugir caso algo desse errado e para evitar atrasos se desse tudo certo. Fernando e Albano receberam informações o suficiente para saber que a explosão nessa área afetaria as duas usinas e que fatalmente todos numa área de pelo menos quinze quilômetros morreriam sem saber o que os atingira. Os demais, em um raio de pelo menos 100km, morreriam em conseqüência da nuvem de radiação.

Durante esse período os contatos entre Fernando e a Sombra cessaram. Jonas tentava todas as noites viajar até o desfiladeiro vermelho, mas não encontrava nem a Sombra quanto nenhum dos demais. Até mesmo as tropas de Dragon estavam ausentes. Em contrapartida, Albano todos os dias ligava para Regina e prestava relatórios sobre seus avanços na cultura local. Em diversas noites Fernando jurou ter escutado gemidos femininos e ter reconhecido a voz de Regina no quarto de Albano, mas desejando evitar problemas Fernando nem comentou a respeito.
E o tempo passou...


Dia 31 de Dezembro de 2006. Ao amanhecer o telefone de Albano tocou. Era Regina avisando que “os fogos chegariam a Angra por volta das duas horas da tarde”. O assassino avisou a Fernando do fato e precisamente às duas horas da tarde, um carro preto da organização chegou à pousada. De dentro dele saíram dois agentes carregando uma enorme mala de metal que deixaram aos cuidados de Fernando. O rapaz levou a mala, muito pesada, até o quarto de Albano e a abriram. Dentro dela tinham duas caixas cinzentas com um display negro apagado e um Pocket PC desligado. Sem entender o funcionamento do equipamento, Albano telefonou para Regina novamente, querendo entender o que faria.
– Estamos com os fogos... Mas como funcionam? – Perguntou Albano, direto e sem rodeios.
– Existe em cada dispositivo um botão azul. Esse botão ativa o contador de tempo dos explosivos e os deixarão em modo de espera aguardando uma confirmação à distância. Para essa confirmação, junto com os explosivos virá um PDA com dispositivo com comunicadores sem fim em diversas bandas, desde a Infra Vermelha a Wireless. O PDA é que vai fazer a sincronização entre os dois, ou seja, vocês ativam os dois explosivos, e o timer vai se iniciar, em seguida deve ativar a sincronização pelo PDA que vai fazer com que o contador de ambos se iguale tomando como base o dispositivo ativado primeiro. – Explicou Regina.
– E o que acontece se não ativarmos o PDA?
– O dispositivo ativado primeiro, explode primeiro... Simples assim. O contador funciona de modo independente, vocês apenas sincronizam a explosão com o PDA.
– Entendi, e qual o raio de explosão dessas coisas?
– De três quilômetros separadas, e de pelo menos 8km juntas... Sim, elas afetarão Angra II, se é essa sua dúvida... – concluiu Regina, desligando o telefone.
– Ordens são ordens. – Afirmou Albano, guardando o celular diante do olhar preocupado de Fernando. – E como soldados, as obedeceremos a qualquer custo. Qualquer custo.
– O que ela disse? – Perguntou Fernando?
– Desejou sorte, apenas. – Responde Albano, com sua franqueza tradicional.

Fernando aceitou a falta de informações de Albano e continuou estudando os explosivos. A única coisa que Albano explicou a Fernando foi que o botão azul servia para iniciar o timer das bombas, do resto nada disse. “Não vale a pena dizer a ele, isso não é algo que lhe cabe...”, pensou Albano ao terminar de mostrar o que fazer. Com esses últimos detalhes, apenas faltava agora executar o plano. Curtiriam um almoço como se fosse a última refeição e depois dariam conta dos últimos detalhes antes de iniciarem efetivamente essa missão.


Os planos de invasão da Usina de Angra I eram bons o suficiente e dentro do esperado pelo que a Organização sempre fornecia. A única exigência era que os explosivos deveriam ser colocados nos pontos desejados até as onze e quarenta da noite, no máximo. Qualquer atraso significaria fracasso total e os dois agentes pagariam pela falha. Albano e Fernando passaram o restante do dia verificando o equipamento. Para sorte de ambos era um dia frio e movimentado. Era bom estar frio porque tornaria mais suportável utilizarem os sobretudos da Organização, e a movimentação era boa porque ninguém repararia em dois indivíduos de sobretudo passeando pela cidade em plena festa de ano novo.

Para evitar problemas com engarrafamentos, ambos optaram por utilizarem motos, que rapidamente foram cedidas por uma das concessionárias locais após duas ligações para a Organização. Eram duas belíssimas motos da Harley-Davidson de 1948, idênticas, que haviam pertencido antes a Marinha do Brasil e foram vendidas como sucata a uma das concessionárias. Fernando sentia-se um deus sobre a moto, e até mesmo o sempre sisudo Albano parecia maravilhado pela oportunidade de pilotar tal raridade.
– Penso seriamente em ficar com ela depois da missão. – Comentou Fernando.
– Que bom. – Respondeu Albano, sem dar muita importância a empolgação do jovem rapaz.



Se olhos humanos pudessem ver seriam tomados por um completo horror. Além das nuvens, onde o céu é mais azul uma enorme massa negra sobrevoava a cidade de Angra dos Reis. Uma horda absurda de feras das sombras urrava ansiosa pelo primeiro badalar dando a elas total liberdade. A liberdade de se alimentarem de todas as pobres almas da face da Terra. Dentre elas uma se destacava. Sua forma era bestial, assemelhava-se com um imenso cachorro de olhos vermelhos e chifres enormes semelhantes ao de um bode. Sua boca tinha enormes presas de trinta centímetros de comprimento em média. Ele era inteligente como um predador observando sua caça e desejava muito saborear o espírito humano.
– Mestre... Mestre... Quando poderemos descer? – Perguntava um demônio de asas pequenas e corpo ainda menor, mas com olhos famintos.
– Em breve... Apenas devemos aguardar que as carniças cumpram sua missão, e então... Poderemos nos alimentar. – Respondeu o enorme ser, sem sequer dirigir o olhar à criatura inferior.

Não muito longe dali, em um pequeno hospital psiquiátrico do governo, a maioria dos pacientes berrava incessantemente. Dentre eles destacava-se um senhor de aproximadamente oitenta anos, chamado entre os seus de “Profeta”. Ele debatia-se violentamente contra as janelas de seu quarto, tentando fugir de algo que os médicos julgavam ser a loucura causada pelos fogos de fim de ano. Se os médicos pudessem ver o que o “Profeta” via, com certeza se juntariam a ele como os demais “loucos” fizeram.
– Eles estão a espreita! O capeta quer nossas cabeças! – Berrava o “profeta”. – Jesus! Tende dó de nós! Jesus!



Finalmente Albano e Fernando chegaram a porta das instalações da Usina Nuclear de Angra I. Devido aos problemas típicos de ano novo, os infernais engarrafamentos que ocorriam sempre e os muitos quebra-molas pelo caminho, mesmo indo de moto apenas chegaram no local por volta de oito horas da noite. Albano sacou de seu bolso dois relógios de pulso e os sincronizou, entregando-os a Fernando. Fernando pegou o relógio, o colocou no pulso e notou que não havia sincronização de horários, mas apenas um timer digital marcando o tempo que ainda tinham para ativar os explosivos. 

Os dois tinham todo o mapeamento da área na cabeça. Diversas vezes se passaram por estudantes para conhecer pelo menos os corredores da administração do prédio principal. Nada poderia dar errado, estava tudo contabilizado. Fernando seria responsável por colocar os explosivos no sistema de refrigeração do Reator, que ficava em um prédio anexo ao principal, e Albano invadiria o prédio principal e tentaria chegar até o reator para instalar o último explosivo. Se por acaso desativassem o explosivo principal, o acidente nuclear ocorreria por falta de resfriamento e se o inverso ocorresse, não precisariam interromper nenhum resfriamento, pois a explosão resolveria tudo. Se ambos explodissem, a missão estava perfeita e nenhum ajuste seria necessário, mas prudência nunca era demais. Albano até lamentava não ter mais explosivos.

Como o serviço de Fernando era dos mais simples, estava tudo calculado que quando faltassem duas horas para a ativação total do sistema, ou seja, apertar o último botão, Fernando estaria encontrando Albano no prédio da administração, exatamente na porta de acesso para a área de acesso restrito. Até aquele momento provavelmente Albano já teria feito a maior parte do serviço sujo e matado a maior parte das pessoas do prédio.
– É agora? – Perguntou Fernando, observando pela última vez as motos e toda a cidade de Angra dos Reis. – Se conseguirmos esse lugar nunca mais será o mesmo.
– Então devia ter tirado uma foto... Essa é a última vez que vemos a civilização. – Respondeu Albano, enquanto subia em uma árvore para cortar os fios de telefone da Usina.
– Por quê? – Perguntou Fernando, sentindo-se intrigado.
– Se destruirmos isso aqui, destruímos a civilização, pelo menos a Brasileira... E sendo a Organização do jeito que nós sabemos, acredito que não seja um objetivo apenas e meramente “terrorista”...
– Como assim?
– Pense, você é capaz de chegar a uma conclusão...

Fernando pensou, calado, alguns minutos. Minutos que Albano utilizou cortando todos os fios de telefonia que podia ver. Não interessava se cortasse o fio certo ou errado, mas sim que cortasse todos. Era fim de ano, e mesmo que a operadora local de telefonia fosse chamada para consertar algo, só atenderia no ano seguinte. Com os cabos cortados e a certeza eu tecnologia celular não funcionava naquela área por causa de espionagem industrial (Albano havia testado todas as operadoras de telefonia móvel antes, pra confirmar), o isolamento de Angra I era completo. Agora apenas faltava-lhe iniciar a invasão.

Albano procurou nos muros cercados de arame farpado uma parte que estivesse mais danificada pela maresia e nem demorou muito a encontrar. Nessas horas era ótimo poder contar com a incapacidade do Governo Brasileiro na gestão de segurança. Havia literalmente um buraco no muro, provavelmente feito para invadirem os bosques dentro dos limites das instalações. Era o tipo de sorte que lhes fariam ganhar pelo menos alguns minutos preciosos para cumprir a missão. Quando Albano começou a invadir o terreno, Fernando finalmente voltou a falar:
– Se for o que estou pensando... Será terrível!

Albano apenas consentiu com a cabeça e sorriu.